Heavy Metal e Progressive Rock – Passado, futuro e presente

Meu retorno ao blog com o “lançamento mundial” do meu CD conceitual “OPEN WINDOWS TO NOTHINGNESS” (e através de nosso recente post referente ao “YES Cruise 2014”) aparentemente despertou o interesse de nossos membros pelo Progressive Rock e sinto-me imbuído na função de dar um “start” nesse tópico.

Lembro que, quando iniciei a composição e gravação do CD, pensei: tenho uma história pra contar, portanto, será um álbum conceitual; obviamente, será Prog-rock… porém, se ouvirem a introdução da 1ª música (“Not Meant to Be – Part I – Massachusetts 52”) imediatamente pensarão: mas isso não seria Heavy Metal? Apesar de meus vocais serem a princípio “leves” e haverem muitas partes mais calmas, todas as músicas tem guitarras distorcidas e a maioria das levadas são pesadas… pois o peso se faz necessário, em contrapartida aos momentos mais calmos… bem, não seria esta a premissa básica do Progressive Rock? Um som calcado no Rock tradicional, com uma dinâmica variada, não linear… mas, por outro lado, é um “guitar driven record”, onde os riffs de guitarra predominam… então não seria Heavy Metal?!?

Aí comecei a me perguntar: que som realmente estou procurando fazer? Como tudo chegou até aqui? Tenho 42 anos, vivi minha adolescência em plenos anos 80, e meus ídolos atuais também…

Assim sendo, a fim de buscar estas respostas, vou procurar neste post traçar um perfil histórico do Progressive Rock em paralelo ao Heavy Metal, e peço para que todos contribuam com informações adicionais e até correções que porventura se façam necessárias.

Bem, para mim, o momento-chave pra dar início a este tema é o final dos 70 e início dos 80.

Com o surgimento do punk-rock na Inglaterra, o movimento progressivo, com seus expoentes Pink Floyd, Yes, Genesis, King Crimson, Gentle Giant, Van Der Graaf Generator, Jethro Tull, dentre outros, tornou-se algo “pomposo” e até “cafona”, sujeito à rejeição total pelos punks (com sua simplicidade e radicalismo) e pelos chamados “new-waves” ou “new-romantics” (com seu extremo apego aos novos teclados lançados pela Roland/Korg/etc. e suas músicas curtas e cheias de refrões pegajosos), rejeitando o virtuosismo e o caráter sinfônico e erudito destas bandas Progressivas. Toda uma nova estética surgia, e a mídia, sempre em busca de novas tendências, comprou as idéias desses novos movimentos, e o Progressive Rock (propriamente dito) viu-se em iminente ameaça de extinção…

Tanto que, no início dos 80, o Yes, com a adição do Sul-Africano Trevor Rabin, adaptou-se fazendo um som mais pop (“Owner of a Lonely Heart” / “Love Will Find a Way”), assim como o Genesis (“That’s All” / “Invisible Touch”), Phil Collins (“Against all Odds”), Peter Gabriel (“Sledgehammer”), King Crimson (na fase “industrial” com Adrian Belew e Tony Levin – “Discipline” / “Beat” / “Three of a Perfect Pair”), Jethro Tull (“A” / “Under Wraps”), o Pink Floyd, já esquartejado, lançava o “Momentary Lapse of Reason”, com as pops “Learning to Fly” e “On the Turning Away”, assim como tantos outros, tentando uma modernização até mesmo por motivos de sobrevivência… obviamente, apesar do “popismo”, estas bandas ainda preservaram a musicalidade inequívoca que sempre tiveram e eram ainda, de certa forma, muito mais “audíveis” do que os artistas que imperavam no mainstream. Até o Rush, canadenses, bizarros, entregou-se aos sintetizadores e baterias eletrônicas, mostrando que a tendência à “simplificação” era inevitável… lembro que na época, ficava ouvindo atentamente os discos e pensando: que timbre é esse? Isso é guitarra ou teclado? Cadê a guitarra?!?!?!

Não obstante, os meninos britânicos (Marillion / UK / IQ / SAGA / Pendragon) e americanos (Queensrÿche / Fates Warning) que cresceram venerando estas bandas de Progressive Rock (e também os “clássicos” como Deep Purple, Led Zeppelin e Black Sabbath, que para mim são todos “heavy” e “prog” ao mesmo tempo, ainda que em menor escala – quem contesta que “No Quarter”, “Child in Time” e até mesmo “Iron Man” não seriam peças progressivas?), não entraram nesta onda punk/pop, permanecendo fiéis à musicalidade e experimentalismo do Prog-rock. Assim nascia o movimento “Neo-prog”…

Concomitantemente, no lado do Heavy Metal, sabemos que, por exemplo, no Reino Unido, o Iron Maiden (apesar de seu vocalista “almost-punk” Paul Di’Anno), tocava para seu pequeno-porém-fiel público no Marquee Club, e nos USA, o Metallica iniciava sua ascensão. Ambas com seus componentes de cabelos compridos e tatuagens, não arredaram pé e acabaram dominando o mundo… mas estas bandas não seriam também progressivas? Músicas longas, com múltiplas partes, mudanças de andamento e time-signature… isso é prog! É notória a veneração de Steve Harris pelo Jethro Tull (quem não curtiu muito a primeira vez que ouviu a versão b-side de “Cross-Eyed Mary” do clássico “Aqualung”?)… nascia então o chamado “New Wave of British Heavy Metal”, dentre os quais, o Judas Priest, Saxon, Diamond Head, Def Leppard…

Nos anos 90, notamos que o rap e o grunge dominavam a cena, com sua crueza musical, e virtuosos como Steve Vai e Joe Satriani tinham um público restrito a apenas músicos… os próprios “Neo-prog” já estavam abrindo as pernas para o pop (Marillion após a saída de Fish e a entrada do “pretty boy” Hogart)… mas quando tudo parecia perdido, aparece o Dream Theater! Lembro do impacto de “Pull me Under”… opa! É disso que preciso! É o Heavy Metal e o Prog-rock em sua essência, modernizado… também não podemos deixar de citar o Soundgarden, Helmet, Pantera.

A consequência disso vemos hoje com Mastodon, TesseracT, Maschine, Pain of Salvation, Porcupine Tree, e outras novas bandas que utilizam-se de ambos os estilos magistralmente. Temos também as super-bandas como o Transatlantic, e notamos que este mundo do Heavy-prog nos tem reservado enormes surpresas, pois a produção atual está intensa, e vemos nomes como Portnoy, Neal Morse, Paul Gilbert, Steve Morse, todos atuando juntos em diversos e variados trabalhos.

Então, felizmente hoje o Prog e o Heavy estão vivos, e com tudo… ao meu ver, as pessoas voltaram a ter a necessidade de consumir algo mais consistente, mais trabalhado, ou seja, ARTE em letras maiúsculas e garrafais… um exemplo disso, fora do mundo da música, é a série de livros “A song of ice and fire” que deu origem à série da HBO “Game of Thrones”, de George R. R. Martin. A história é extremamente humana, complexa e intrincada, com milhares de personagens, todos importantes, requerendo muita atenção e percepção do leitor/espectador. O “arco de Hollywood” com o mocinho e vilão definidos, foi esmigalhado, e a cada capítulo o espectador sofre com “twists and turns” inesperados… o próprio autor se diz espantado com o sucesso que alcançou, uma vez que, cansado de ser um medíocre roteirista de TV, apenas pelo prazer, criou uma história que acreditava não interessar a ninguém, e hoje é um dos maiores best-sellers de todos os tempos… e o primeiro livro foi lançado quando ele já tinha 48 anos…

Como sugestão, cito a “bíblia online” do Progressive Rock, o site Progarchives, que há vários anos tenho usado como guia para conhecer bandas novas, e até as antigas que nunca foram comercializadas no Brasil. Ali notarão a quantidade de bandas novas que misturam os elementos do Prog e do Heavy. Lá notarão ainda que há a classificação destas bandas em estilos distintos, como o Experimental Progressive Metal (Mr. Bungle, Fantômas, Secret Chiefs 3 e Estradasphere) / Art Metal (Devin Townsend, OSI e Tool) / Ecletic Metal (Indukti, In The Woods… e Maudlin Of The Well) / Avant-gard Metal (Unexpect, Ephel Duath e Virus).

Concluindo, a distinção entre o Heavy e o Prog atualmente tornou-se muito tênue, quase invisível, e o futuro me anima…

Keep blogging, heavy and progging!

Abilio



Categorias:Artistas, Bandas Independentes, Black Sabbath, Covers / Tributos, Deep Purple, Dream Theater, Iron Maiden, Jethro Tull, Judas Priest, Led Zeppelin, Marillion, Mastodon, Músicas, MetallicA, Off-topic / Misc, Pantera, Pink Floyd, Queensrÿche, Resenhas, Rush, Yes

8 respostas

  1. Abilio, tive o privilégio de acompanhar este seu segundo post por aqui, o primeiro falando de sua especialidade de uma maneira mais abrangente, então fico suspeito para comentar até…

    Quero dizer apenas que sua análise é coerente e vai em linha com o que eu também penso quanto aos exemplos citados de heavy metal. Não conheço a maioria das bandas por você citadas por mundo prog, as enciclopédias que habitam por aqui talvez possam se manifestar melhor quanto a elas, mas posso falar do que humildemente acho…

    Para mim, a linha é extremamente tênue para os estilos em geral entre rock e metal, e muitas vezes o que pode ser considerado o limítrofe para um, não é exatamente o ponto para o outro. A única certeza é que uma coisa acaba muitas vezes “invadindo” ao outro, e isso é natural. Por isso que eu acho que é difícil rotular bandas e estilos – eu particularmente não consigo facilmente, claro que há exceções que o estilo é claro e de entendimento comum, e sinceramente, dependendo da discussão, acho que nem vale a pena entrar no mérito.

    Como você bem disse, não há como negar que “peças” do Maiden não flertam com o progressivo. Mas é claro que sim! Hoje ouvi “Alexander The Great” na Kiss FM e já tendo conhecimento do post, veio isso à cabeça. O MetallicA, idem – a partir de The Call Of Ktulu e até o …And Justice For All, há exemplos claros.

    O que há são bandas que, dentro das suas discografias, flertam com n estilos também. O Kiss atirou para todos os lados ; o MetallicA tem coisas que remetem ao hard rock ; o Maiden, no início, uma coisa meio indefinida entre metal e punk – punk-rock, sei lá. A verdade é que nada está errado e é claro que o progressivo exerce um papel no metal fundamental na estrutura do gênero – tanto é verdade que pegamos as influências das bandas oitentistas, quando a NWoBHM apareceu, e vemos as influências destas…

    Fico feliz em ver que você vê com bons olhos o futuro. Eu não sei se vejo tão fácil assim, confesso, principalmente para o heavy metal tradicional (que, claro, minimamente flerta e muitas vezes usa e abusa destas características progressivas). Mas vamos acompanhando, vendo/ouvindo e torcendo…

    Novamente, parabéns pelo post e que venham muitos outros, é sempre um prazer – além do aprendizado.

    [ ] ‘ s,

    Eduardo.

    Curtir

  2. Olá Abílio,

    mais uma vez obrigado (e parabéns) por trazer seu texto para gente. Acho que graças à equipe temos cada dia um local de ricas informações e prismas. A forma como tudo é colocado é coisa rara de se ver na internet, sem exagero. Dos textos aos comentários.

    Eu diria – sem pretensão de acrescentar nada ao seu texto – que a diferença mais tangente da música de algumas bandas que você citou com influências do progressivo é a fonte de inspiração das primeiras bandas de prog, que obviamente é a música erudita, o que torna bandas de uma segunda geração ou quase contemporâneas (como Led Zeppelin), bandas que possuem pitadas de elementos da chamada música progressiva mas não ‘filhas’ da música erudita.

    Eu considero que muitas bandas passaram a construir e compor seus arranjos dentro das bases estéticas do rock progressivo sem fazerem no entanto progressive rock, entende?

    As bandas mais atuais, citadas por você, como Pain of Salvation, Porcupine Tree e incluo ainda o Opeth, já carregam uma bagagem sonora construída a partir do metal, recebendo influências do progressivo e lógico também da música erudita, maior origem de inspiração do progressive rock, além das temáticas filosóficas.

    Espero que você participe de algum podcast conosco. Iria ser enriquecedor para todos nós.

    Abraço,

    Daniel Junior

    Curtir

  3. Outro um grande post Abilio, primeiramente gostaria de agradecê-lo por escrever mais uma vez sobre o progressive rock, afinal de contas esse e’ um estilo que teve e tem muita importância dentro do Rock e seu fantástico mundo e legado vale a pena ser conhecido, mas que infelizmente ainda e’ muito pouco divulgado, pelo menos nos últimos anos. Aproveitando a ocasião, preciso citar mais uma vez o valor de estar convivendo com todos aqui do Minuto HM, pois e’ um prazer encontrar em um mesmo lugar varias vertentes do estilo sem que isso cause algum tipo de conflito, provando que o blog e’ democrático e que acima de tudo há um respeito mutuo, independentemente do assunto tratado, creio que já escrevi isso antes, mas nunca e’ demais repetir.
    Bem, sobre o post… posso dizer que ele me fez refletir muito, mas muito mesmo! E principalmente, acabei desempoeirando boa parte dos meus velhos vinis de progressivo que por vários anos não viam a luz, mas apesar de todo o trabalho que isso me causou, tudo acaba sendo um enorme prazer, nos faz voltar ao passado. Analisando tudo que você escreveu, hoje penso que nossas opiniões são bem diferentes em grande parte dos assuntos abordados no post, mas isso não quer dizer que estou certo e você errado, ou vice-versa, apenas que temos pensamentos e opiniões diferentes em relação ao mesmo tema. Porem não cabe aqui ficar questionando ou expondo tudo que penso sobre o assunto, mas sim mais uma vez agradecer-lhe pelos momentos de distração e reflexão que o post nos proporcionou. Quem sabe esse não seja um incentivo e uma boa oportunidade para as pessoas que ainda não tem muita intimidade com o progressivo possam conhecer mais sobre esse extraordinário estilo!

    Curtir

    • Agradeço a atenção e comentários até o momento!

      J.P., fiquei bastante curioso agora e gostaria de saber estas opiniões e pensamentos… A intenção é realmente que vocês tragam elementos e prismas diferentes do meu, sacudindo o meu enfoque, talvez “estático” e parcial acerca do tema.

      De qualquer forma, se o post pelo menos já te fez tirar uma pilha de discos prog da poeira e refletir, valeu muito a pena!

      Curtir

  4. O post é excelente e vem de encontro ao que acredito em boa parte, Abílio.
    Realmente o Metal e o Progressivo se misturaram e a diferença agora é bem menor,embora eu também seja meio enrolado para entender todos esses gêneros.
    Você citou bandas que eu tenho uma grande admiração e que em algum momento ( ou vários deles) flertou com o progressive sendo metal na essência e menos frequentemente no inverso.
    Adoro a mistura , mas a grande diferença entre nós é que eu não consigo ser tão otimista em relação ao futuro e pior ainda , falta tempo para conhecer bandas que ficaram no passado ou então mais conhecidas atualmente ( Fates Warning e Opeth são exemplos pra mim).
    O mais legal aqui no entanto é essa troca de conhecimentos entre você e o JP, eu fico daqui aplaudindo sempre, espero que esse papo se prolongue.
    E pra trazer uma breve discordância, considero sim No Quarter ( entre outras do fantastico Led ) e Child in Time ( do não menos fantastico Deep Purple) exemplos clássicos de músicas que buscaram o caminho progressivo para serem não menos que sensacionais. E podemos incluir as citadas pelo Eduardo da década de 80 , tanto Alexander the Great como …And Justice for All também estão firmes nessa, no meu entendimento. Alias, pelo que sei há um comentário do Rick Wakeman que atesta que esse album …And Justice for All é um dos melhores exemplos de rock progressivo, eu tendo a concordar com ele.
    Só não concordo com Iron Man, pra mim um exemplo purinho de Heavy Metal do grande Sabbath. Mas como disse, eu tenha essa dificuldade de entender canções como exemplo do estilo A ou B. Se tivesse de escolher, no repertório do Sabbath tem outros belos exemplos de flerte com o progressivo como a minha favorita música da banda da fase Ozzy : Megalomania, do Sabotage.
    Por fim, espero ler mais comentários neste fantastico post e continuar aprendendo ….

    Alexandre Bside

    Curtir

    • Obrigado Bside, pelo comentário mais que pertinente!

      Concordo plenamente com “Megalomania” como exemplo de um Sabbath “prog”. Citei “Iron Man” já sabendo que estava andando na beirada da areia movediça… Talvez a utilizei como exemplo mais por sua popularidade, mas a intenção era de expor a idéia de que, na fase imediata pós-Stones e Beatles, estas bandas “clássicas”, apesar de serem bem diferentes entre si, surgiram no cenário musical ainda rotuladas apenas como “Rock”, despreocupadas e livres de qualquer classificação, mas todas tinham musicalmente elementos em comum, como as influências do Blues e seus então recentes desdobramentos, e também acredito que devido ao fato da música ser ensinada majoritariamente em igrejas, corais e na escola (teórica), havia uma formação erudita como background de muitos daqueles jovens.

      O que sempre me impressionou muito no Black Sabbath é o forte “imaginário” que a banda evoca, desde a capa dos álbuns, a sonoridade das gravações, o visual da banda, as letras… Todas estas características marcantes sempre me fizeram encará-la como uma banda “progressiva”, apesar do fato incontestável de serem os “pais do metal”.

      Mas pensando bem, o que difere os estilos, então, não seria também a temática? Enquanto o Yes mantinha uma linha “paz e amor”, como em “Time and a Word”: “the time is now… the word is love”, o Sabbath abordava o sobrenatural, o macabro, assim como o abuso de drogas, temas políticos, a guerra, a marginalização…

      Acredito que esta classificação e a sub-sub-sub-classificação que hoje vemos em tudo – até no Direito, Medicina, etc. – e no caso, no Rock (realmente às vezes ininteligível), acabou sendo a consequência de uma recorrência de elementos comuns que acabaram agregando as bandas em diferentes “estilos”. E isso é algo intrínseco da natureza humana, que tende a nomear e classificar tudo que existe…

      Curtir

  5. Essa versão da Cross Eyed Mary é maravilhosa , vocal do Bruce e instrumental perfeito , acho melhor q a original do Tull q tbm é ótima !

    Curtir

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.