Discografia HM – Fleesh: música de qualidade no Rio de Janeiro? Existe, está no underground…

os 4

Pessoal, como vocês podem ver no post que publiquei ontem sobre os canais do YouTube, o excelente Resenhando indicou recentemente vários bons álbuns em 2019. Resolvi dar uma checada nas dicas, acabei me deparando com essa dupla chamada Fleesh, que faz um progressivo bastante melodioso, e ainda que não seja o mote principal do Minuto HM, vale uma indicada aos que curtem um som mais calmo e viajante.

Aliás, com o novo lançamento do Sepultura, estou vivendo um momento de extremos. De um lado, avaliando boa parte da carreira da banda de vocal super agressivo, de outro lado, ouvindo a calmaria do Fleesh… parece até o cenário político de um certo país…

Bem, deixando a ironia de lado, fui checar o Fleesh nas plataformas digitais, no meu caso, via YouTube, tentando entender como se desenvolveu o trabalho da dupla. O projeto é composto pela vocalista Gabby e pelo multi instrumentista Celo. Ambos são realmente muito bons no que fazem. A voz de Gabby é emocionante e cristalina, encaixando com o instrumental totalmente desenvolvido por Celo. Ele grava as guitarras, baixos, teclados e, pelo que entendi, programa a bateria. Aqui fica um pequeno desagravo meu, não muito acostumado a ter um programação de bateria ao invés de uma sonoridade de ofício. Os bateristas do blog nesse momento podem ter virado as costas para o trabalho da banda, o que eu até entendo. A questão é que eu não consegui ficar imune à qualidade do músico e da cantora. Ainda mais sendo do Rio de Janeiro. Mau exemplo musical aqui é que não falta.

A dupla fez inicialmente um trabalho autoral, um primeiro álbum não lançado de forma física chamado My Real Life. Esse eu ainda não chequei. Há outros dois de músicas inéditas lançados também em CD, What I Found e o recente Across the Sea, que foi comentado e elogiado no canal de YouTube do Resenhando. Além disso, eles gravaram dois tributos (ao Rush e ao Marillion), lançados já de forma física, e disponibilizaram várias outras versões de bandas como Genesis, Renaissance ou Pink Floyd, mas também Queen, Duran Duran ou Sting em formato digital. Eu confesso que já havia muitos elementos que me agradavam aos vê-los nos vídeos do YouTube, inclusive pela opção de Celo em usar alguns baixos Gianninis e um incrível Fretless da Dolphin, raros baixos brasileiros. A coisa começou a ficar “séria ” quando eu vi esse vídeo com a música Ashes Are Burning, faixa-título do álbum clássico do Renaissance:

Bem, pra resumir esse post, senão o negócio vai ficar um testamento, entrei em contato com a banda pelos canais digitais, tirei algumas dúvidas acerca do CDs físicos, e esclarecidas tais dúvidas, comprei tudo… é… tudo…

E o que achei disso? Bem, para isso, quem já não tiver desistido desse post, vai precisar avançar na leitura abaixo:

Em tempo: os CDs vinham autografados… eu não queria tê-los autografados. Nunca curti esse negócio de um músico “rabiscar” um instrumento, um vinil, um CD. Aí, eu tive de “negociar” isso com a dupla. Eles mandaram o autógrafo à parte…

autorais com adesivo e autografo

Gabby e Celo, se vocês forem ler isso aqui, já peço desculpas pela excentricidade minha. E agradeço o tratamento único e a gentileza de vocês. Vamos lá:

1) Os trabalhos autorais:

What I Found – 2017

what I found

What I Found eu ouvi depois do Across the Sea. E assim considerei o álbum, embora definitivamente com o pé fincado no progressivo, menos sombrio que seu sucessor e com um acento ligeiramento mais pop. Os solos tem timbres que lembram Gilmour no Pink Floyd, aliás, muito bons. A faixa titulo já exemplifica isso muito bem, se destaca no disco. Um refrão acessível e agradável. Um belo solo. A faixa que se segue (Frankenstein) traz uma parte intermediária com mais foco no progressivo vindo dos anos 1970 que se mistura com um outro bom refrão, esse com uma característica que me lembrou o Marillion. É uma faixa mais ousada, com espaço para alternâncias instrumentais, também se destacou no disco.

If I traz esse lado mais pop que citei, competente e acessível. Outras faixas trazem momentos mais calmos, como Dust ou igualmente acessíveis, como System’s Down, Reply e Good Luck. Gostei bastante de Run, também mais calcada no som dos anos 1970. A guitarra no estilo Gilmour tem ótima participação. E Blood on the Street tem mais espaço para o instrumental, fechando o álbum muito bem.

Across the Sea – 2019

across the sea

O último álbum de faixas inéditas me parece uma agradável evolução ao desenvolvido no já citado bom álbum What I Found. As letras trazem um conceito amarrado, baseado em estágios da depressão, pelo que li no review da própria banda. The Beginning abre o álbum e é uma excelente faixa, ótimos teclados, riff de guitarra bem sacado e ótimas melodias vocais. É uma grande música da dupla.

Black Hole vem em seguida e não decepciona. Outra ótima faixa. My Only Hope tem um ótimo refrão e também mantém o nível. Outro bom riff está em Echo, completa as 4 primeiras músicas de forma muito coesa. A faixa-título é basicamente acústica, sem bateria, diferente do restante do álbum. Trata-se de uma faixa que destaca a delicadeza dos vocais de Gabby. Não é para todos, no meu entendimento, não compromete. Rescue Me poderia estar no álbum anterior, mais melódica, menos sombria, com um refrão mais “grudento”, mas não destoa por ser uma ótima composição. Há um trecho de baixo com efeitos em modulação que me lembra agradavelmente o Pete Treewavas, do Marillion. Segue-se um solo que deixaria também o Steve Rothery bastante feliz. Weight of the World mereceu um vídeo no canal da dupla e também destaca-se tanto pelo refrão quanto pelo ótimo instrumental. Whispers, a penúltima faixa, já vem bem, mas do meio pro fim se transforma num clima que lembro o final do álbum Scenes From a Memory, do Dream Theater. Uma agradável lembrança, diga-se de passagem.

Letters to Nobody fecha o trabalho com um clima sombrio que traduz todo o conceito, desde a capa até a última nota da canção e mais um excelente solo. Não há dúvidas para mim, Across the Sea é um senhor álbum de progressivo.

2) Os tributos:

tributos

 

The Next Hemisphere – A Rush Tribute – 2017

the next hemisphere

Fazer um álbum tributo ao Rush é um baita desafio e eu preciso dizer que no meu entendimento a dupla, além de fazer bonito, foi inteligente na escolha das músicas. Eles fizeram, sempre no meu entendimento, a escolha por músicas mais melodiosas do grande trio canadense, evitando as faixas mais longas, de maiores espaços instrumentais ou mais pesadas mesmo. Além disso, buscaram percorrer a carreira toda da banda, inclusive com faixas mais recentes. Essa boa escolha traz versões muito competentes, além da dificuldade que deve ter sido emular uma bateria daquele que considero o melhor do instrumento de todos os tempos. Posso citar Limelight e Losing It como destaques. A versão de Closer to the Heart está próxima do original, muito bem feita, com atenção a detalhes como o sino e o teclado que era feito por Geedy Lee no pé (aquele “gravão” do Moog). A versão de Tears opta por um arranjo mais obscuro e espacial, com acento nos teclados, em detrimento aos violões. Ficou ligeiramente diferente, mas muito bonita. A maior surpresa vem por conta de gravar aquele blues arrastadão que é Here Again. Por essa eu não esperava. À dupla, meus parabéns pela ousadia. Ah, ainda tem a minha faixa favorita do Rush (The Trees) e duas faixas que pelo que entendi só existem na versão física: The Pass e The Garden (emocionante faixa que encerra a carreira autoral do grande grupo canadense). Ouvir esse tributo é sorrir do início ao fim.

Script For a New Season- Marillion Tribute – 2018

Bem, aqui, no meu julgamento, é onde a dupla está mais à vontade. Talvez o Marillion seja a maior influência no que se percebe do trabalho autoral deles. E há uma incrível proximidade e intimidade com o som da banda inglesa de neo-progressivo. Então, se você curte Marillion entenda que esse tributo em CD duplo é como bater um pênalti sem goleiro – difícil não acertar em todas as vezes que você chutar. Esse é o CD entre os quatro de maior facilidade de fazer um review, tudo aqui é sim muito bom. Não há muito o que escrever, a voz de Gabby encaixa muito bem tanto nas canções com Fish como com as canções cantadas por Steve Hogarth. A sonoridade de teclados, baixo, guitarras, solos, tudo beira à perfeição. Os timbres cristalinos de Steve Rothery com os captadores single coils estão espetaculares. Solos, então… Steve, você já ouviu isso? E como um ótimo álbum duplo, aqui o que se encontra é uma ótima coletânea brilhantemente interpretada pela dupla. Minhas favoritas? Blind Curve, Seasons End, Script for a Jester Tear e Dry Land. Bem, tem também uma espetacular versão de Sugar Mice, solo de guitarra simplesmente lindo, linhas de baixo maravilhosas, mas não sei se aqui a questão emocional fala mais alto. Essa é a música do casal aqui desta residência, se é que vocês entendem…. ah, a versão em CD físico ainda traz o bônus de Beautiful, que não se encontra na versão digital.

Ufa, chegamos no fim, é isso. Entendo que o Fleesh trabalha com afinco também o mercado internacional, já se lê vários comentários no YouTube deles de todos os lugares do mundo, a grande e imensa maioria elogiando bastante o trabalho. O estilo é viajante e calmo, um pouco diferente do que estamos habituados aqui no blog. Ainda assim, é altamente indicado. A banda fez um show no fim do ano passado, mas naquele momento eu não conhecia. Quem sabe em uma próxima oportunidade? Ah, e parece que vem um tributo ao Renaissance e ao Genesis. Que passemos pelo momento difícil que estamos e que novas experiências musicais do Fleesh se apresentem!

Contato e demais informações da dupla aqui.

Saudações a todos

Alexandre Bside



Categorias:Artistas, Bandas Independentes, Covers / Tributos, Discografias, Dream Theater, Marillion, Músicas, Pink Floyd, Queen, Resenhas, Rush, Sepultura, The Beatles

21 respostas

  1. Mais um representante da linha Heróis da Resistência (quem dera houvesse tantos mais outros), o Fleesh faz um trabalho impecável, que irá agradar principalmente (como já mencionado acima) à linha do Progressivo mais suave (Marillinon). Há interpretações marcantes da dupla muito talentosa, meio que perdida numa cidade onde a verdadeira música não é valorizada. Então vale cada centavo (ou mais) e para os que gostam do estilo, indico como imperdível. Agora vai aqui uma menção honrosa para o texto irretocável de B-side. Posso dizer com orgulho fraterno que há poucos escritores (escritores, mesmo) que conseguiriam trazer com tanta propriedade e acurácia para o papel as sensações do tema. Precisamos ter mais registros aqui. E parabéns para o Minutohm que mantém o espaço aberto para essas leituras inspiradoras.

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  2. Excelente post Alexandre!!! Me lembro de ter te ouvido comentar sobre o Fleesh no último podcast, também me recordo de ver a capa do Script For a New Season Marillion Tribute. Porem nem uma das duas vezes me chamou a atenção a ponto de querer ouvir algo. No caso do álbum, é que álbuns tributo já encheram um pouco, esgotaram a fórmula. Apesar de ter sido “fisgado” por esses trabalhos há vários anos.
    O segundo motivo, é que o Marillion, principalmente da fase Fish, ainda é uma das minhas bandas preferidas. E por muito tempo tentei encontrar um grupo do mesmo estilo que pudesse ser tão bom quanto. Toda vez que lia ou ouvia algo que dizia que aquela banda lembrava Marillion, eu corria atrás com a expectativa de conhecer um novo Marillion.
    Foi assim com o Arena, Pendragon, Galadriel, Jadis, etc, etc… Até que eu compreendi que o Marillion é único, assim como AC/DC ou Iron Maiden, não tem como ter dois.
    Porem depois desse post fiquei muito interessado em conhecer o Fleesh e com certeza irei entrar em contato com eles. Porem no meu caso, acho que vou pedir os CDs autografados…KKK
    Obrigado pelas dicas e assim que os ouvir volto aqui para passar as minhas impressões. De momento só tenho uma certeza, concordo 100% com o Flavio, esse post é mesmo inspirador!!!
    Um abraço.

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    • JP, muito obrigado pelos elogios e vale sim checar a qualidade do Fleesh. O material deles está amplamente divulgado no YouTube, e embora eu saiba que você é chegado em ter a mídia física sempre é possível ter um pré-julgamento antes. A história dos autógrafos anda rendendo, heim? Muito bom, rsrsrsrrs…
      Em relação ao Marillion, eu também sou meio viúvo da fase Fish. Há no entanto pelo menos 2 álbuns que vale dar um tempo a mais de audição na fase Hogarth. Um eu sei que você já conhece, que é o Seasons End. O outro é o aclamado Brave. Mas precisa ir com calma, é trabalho complexo.

      Alexandre

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  3. Vcs não imaginam o qto fico feluz da minha indicação no Resenhando estar ressonando nos ouvidos de vcs. Fleesh é especial. Assim como a Gabby e o Celo.❤️

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    • Jay Roxx, é o irmão do Ale, ele deve responder ao seu comentário também. Conhecemos o Cláudio Borges lá da Headbanger e já batemos altos papos lá na loja. A indicação é ótima e vamos continuar acompanhando a banda e também o Resenhando.
      P.S Pimenta: vou colocar um comentário no video lá do Resenhando em que vc fala sobre os beatles (tá doido?) alias segue um video, para sua redenção…

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    • Jay, obrigado por aparecer por aqui e pela dica do Fleesh. Lembro de você citar a elegância da banda. Perfeito!
      Um grande abraço ao Cláudio e ao Daniel. Eu não sei se você viu, mas eu indiquei também o Resenhando no link que você pode acessar no inicio desse post ou diretamente por aqui:

      https://minutohm.com/2020/03/28/a-era-do-youtube/

      Já estou acompanhando o canal de vocês há um bom tempo, me inscrevi para receber as notificações e espero sinceramente que vocês tenham muito mais reconhecimento.

      Um abraço,

      Alexandre

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  4. [ ] ‘ s,

    Eduardo.

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  5. Há muita coisa aqui
    Muita coisa boa
    O surgimento do pessoal do Resenhando, post do Alexandre B side
    Uma banda extraordinária e toda a nossa atenção ao detalhes do post.
    Comecei a audição mas travou tudo
    Chato demais demais
    Assim que eu ouvir retorno
    Na verdade ouvi um pedaço de um dos vídeos
    Espero concluir logo

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  6. Nossa
    Dentre as várias qualidades do material musical me impressionou a pronúncia perfeita do inglês da vocal
    Impressionante
    Muito bom
    Perdidos no Rio de Janeiro

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  7. Quero iniciar esse comentário elogiando o excelente texto. Aliás não é a primeira vez que digo e vou repetir, poderias estar escrevendo para qualquer mídia especializada (bons tempos das revistas). Aliás mais um excelente robe além das guitarras.
    Mas então… depois desta excelente resenha posso dizer que posso apostar todas as minhas fichas na banda. Os tributos são das bandas que eu curto, a competência já foi atestada com o selo B-side de qualidade. Só resta parar e aproveitar. A propósito fiquei muito curioso com as versões do Marillion pós Fish. Depois de absorver a discografia da banda em 1989 foi um choque para mim a mudança de vocal, o que me fez abandonar a banda. Então, com o vocal tão elogiado da Gabby acho que será uma bela surpresa.
    Bacana também o reconhecimento da band, do Jay Roxx que também já assisti a diversos vídeos no Resenhando e são muito bons.
    PS: audição de Sepultura e Fleesh em paralelo não é pra qualquer um! rs
    Valeu!

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    • Claudio, obrigado pelos elogios , meio exagerados, aqui pra nós, mas beleza. Vou aguardar suas novas impressões, sei que está aos poucos ouvindo o material, em especial a do cd duplo e tributo ao Marillion , por trazer faixas da fase pós Fish.

      Valeu!

      Alexandre

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  8. Tive contato com o Fleesh pelo B-Side, mas um pouco antes dele comprar o material e escrever o (muito bom) post. Na hora eu lembrei do Pepo & Elo, um casal francês que faz covers do Dream Theater, mais ou menos no mesmo estilo do Fleesh – a mulher canta e o cara grava tudo.

    Eu ouvi o tributo do Rush e é muuuuito bom.

    E é muito bom ter uma banda brazuca nova na cena – estamos em falta disso. Talento não falta para essa dupla decolar (talvez mais músicos rsrs).

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    • Kelsei, a lembrança da dupla francesa é muito adequada mesmo. Aliás o próprio Dream Theater colocava os covers deles nos PAs antes dos shows.
      Vale a pena checar o material autoral , eu indicaria firmemente o Across The Sea como entrada.

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  1. A era do YouTube – Minuto HM

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