Discografia Rush – [Apêndice A]: álbum Hemispheres – material bônus (disc 2) da versão comemorativa do 40º aniversário: Live at Pinkpop Festival – 4 de junho de 1979

Por ocasião do lançamento da versão do 40º aniversário do álbum “Hemispheres” (1978) em 16 de novembro de 2018, foi possível ter registrado oficialmente em parte o show que encerrou aquela turnê, em junho de 1979. Originalmente esse material foi obtido por uma transmissão de rádio do festival holandês Pinkpop, em sua nona edição.

Em breve histórico, o festival teve sua primeira edição em maio de 1970. Durante os demais anos alguns headliners foram Beck, Bogart and Appice, Uriah Heep, Thin Lizzy, entre outros.  Em 1979 o festival era um dos principais da Europa, com 52 mil ingressos vendidos rapidamente.  Até 1986 o local escolhido para sediar o PinkPop Festival era o parque Burgemeester Damen Sportpark em Geleen, Holanda. Ainda hoje o festival é um grande evento, faz parte dos melhores no formato no verão europeu e já sediou mais de 50 edições.

Segundo os policiais locais, em 1979 outros 20 mil fãs conseguiram acessar os shows com ingressos falsos.  Para a banda, era uma cartada perfeita, um final de turnê em altíssimo nível. O Rush não era ainda um grupo conhecido em grandes festivais e tratava-se de uma visibilidade ímpar. Uma pausa forçada causada por um acidente envolvendo uma das mãos de Alex Lifeson depois do show de Hamburgo (no dia 29 de maio de 1979) os fez cancelar os três shows seguintes –o de Manhein foi suspenso na última hora, pois Lifeson insistiu em tentar fazer o show até poucos minutos antes, mas sucumbiu à tanta dor. Assim, a banda acabou por descansar um pouco da exaustão do fim da turnê, ficando fora do palco entre 29 de maio e 04 de junho. Os shows no festival começaram às 11 horas com Massada, The Average White Band, The Police, Dire Straits, Elvis Costello, Rush e por fim Peter Tosh.  O show do Rush iniciou-se por volta das 6 horas da tarde. Outro fator interessante foi o fato de bandas de estilos mais diversos estarem juntas no mesmo palco, entre elas o The Police, que viria a influenciar o trabalho dos canadenses em um futuro não tão distante.

O show, por questões de tempo do festival, já não se traduziu no set list total da turnê, porém o que saiu oficialmente também não traz todo o set que foi tocado. A banda não tocou do set principal “By Tor & The Snow Dog” e “Bastille Day” e passou “Something For Nothing” para o fim do show. Além disso, já no fim da turnê haviam deixado de fora “Circumstances”. E por fim, apenas o trecho inicial e o final da faixa-título foram tocados.

A gravação, no entanto, perdeu mais trechos do show do PinkPop. Parte do meio do show, especificamente na execução de “2112”, foi perdida na troca de fitas de gravação que o engenheiro responsável manuseava. Ainda hoje há controvérsias de qual versão de “2112” acabou sendo utilizada no bônus-disc do álbum “Hemispheres”, versão 40º aniversário, de certo há que não é a do show no festival da Holanda. A maioria das fontes indica que foi disponibilizada a versão de um show em Tucson no Arizona, em 20 de novembro de 1978 e é esta a informação constante do encarte. No entanto, outras fontes sugerem que isto é uma incorreção, já que se trata da versão feita no show da em Offenbach, Alemanha Oriental, em 28 de maio de 1979.  Outra controvérsia cabe ao fato de haver uma dúvida se a faixa de abertura “Anthem” foi ou não tocada no festival. Acreditamos que a banda não abriria o show com “A Passage To Bangkok”, então a segunda faixa no set-list, uma vez que de 1974 a 1979, “Finding My Way”, “Bastille Day”, e “Anthem” sempre foram as músicas de abertura dos shows. Acreditamos então que também houve algum problema na tentativa de gravar “Anthem”, provavelmente devido a um atraso no início da gravação da transmissão da Rádio FM. Além disso, no início deste registro de ““A Passage To Bangkok”, Geddy Lee agradece ao público, provavelmente se referindo aos aplausos da plateia para a canção anterior. Acreditamos então que o set list foi alterado e encurtado para caber no formato do festival, mas também achamos que o que está neste material bônus não é o show todo. É, então, bem possível que Live Radio Broadcast do festival não tenha transmitido a primeira faixa, e até outras.

O box set versão super deluxe traz três discos de vinil que efetivamente repetem o conteúdo de dois CDs e oferece um livro de capa dura de 40 páginas com um extenso ensaio de Rob Bowman. Além disso, outros itens são uma réplica do programa da turnê de 1979, um pôster, um patch para passar a ferro e um passe VIP. Os outros dois formatos físicos são versões dos dois CDs da caixa e da edição de vinil 3LP.

 O cd bônus vem disposto, então, da seguinte maneira:

“A Passage to Bangkok” (4:03)
“Xanadu” (12:32)
“The Trees” (5:10)
“Cygnus X-1 Book II: Hemispheres” –“The Sphere (A Kind of Dream)” (0:54)
“Closer to the Heart”(3:16)
“La Villa Strangiato”(11:22)
I. “Buenos Nochas, Mein Froinds!”
II. ‘To Sleep, Perchance to Dream…”
III.” Strangiato Theme”
IV. “A Lerxst in Wonderland”
V. “Monsters!”
VI. “The Ghost of the Aragon”
VII. “Danforth and Pape”
VIII. “The Waltz of the Shreves”
IX. “Never Turn Your Back on a Monster!”
X. “Monsters! (Reprise)”
XI. “Strangiato Theme (Reprise)
XII. “A Farewell to Things”

In the Mood” (2:37)
“Drum Solo” (7:31)
“Something for Nothing” (4:21)
“2112” (19:46)
I-Overture
II-The Temples Of Syrinx
III-Discovery
IV-The Presentation
VI-Soliloquy
VII-Grand Finale

Obs: Neste formato de apêndice, os comentários do conteúdo musical virão de forma mais concisa, que é mais apropriado para um post que vem com o intuito principal de complementar o post principal. É desta forma que pretendemos fazer com os demais apêndices que virão na sequência desta discografia.

O material é inegavelmente de uma época dourada da carreira da banda. A qualidade do som nem é o que mais se destaca, não está no nível de outros álbuns oficiais ao vivo do grupo, o que é até coerente ao se entender que se trata de um material bônus, gravado diretamente em estéreo da mesa de som para ser exibido via a estação de rádio FM, portanto, o show foi mixado ‘em tempo real’ sem possibilidade de uma remixagem em estúdio. A exuberância do trio, no entanto, não passa despercebida, já na primeira faixa disponibilizada, a segunda faixa do show no Pinkpop festival. Claramente não é “A Passage To Bangkok” que abre o show, e sim “Anthem” que, como já explanado acima, não está aqui. Esta versão de “A Passage To Bangkok” é, cronologicamente, a primeira versão ao vivo conhecida na discografia da banda. Os agudos de Geddy estão ali, firme e forte, o vocalista teve uma breve pausa inesperada que certamente recuperou em boa parte a plenitude de sua voz ali em 1978 e isso deveu-se ao fato de Alex ter machucado a mão alguns dias antes. Assim, só temos elogios para a canção e sua execução. Percebe-se claramente o uso do Moog Taurus Bass Pedal na função de baixo durante o solo de Lifeson, que tem um ou outro mínimo equívoco. No final em 3:29 a banda traz aquele acréscimo arpejado com baixo e guitarra que não consta da versão de estúdio, mas já era por nós conhecido no duplo “Exit… Stage Left”. Aqui, estes arpejos estão super precisos. Ótima versão. Na sequência, entra “Xanadu”, que no trecho viajante de seu início, em especial em 1:18 um acréscimo super bem-vindo de notas no baixo de Lee. É outra versão muito bem executada, Alex muda ligeiramente algumas notas em 8:43, Lee altera ligeiramente os vocais aqui e ali, traz um agudo impressionante por volta dos 10 minutos, mas de resto é uma versão muito próxima ao que a banda já fazia. Lee apresenta a recente faixa “The Trees”, na sequência. Alex dá uma ligeira testada no violão antes de propriamente executar a canção, e novamente o grupo entrega uma ótima performance. A guitarra nos parece mais alta do que em outras versões ao vivo conhecidas. Há um ligeiro atraso na primeira nota do teclado na parte do meio da canção, coisa mínima. Peart usa e abusa dos elementos percussivos ao fim da canção.

O show segue editado, infelizmente sem a maior parte da nova faixa “Cygnus X-1 Book2: Hemispheres.” O material disponibilizado traz apenas a parte final da canção, “The Sphere” (aonde nota-se que há um breve desencontro na entrada do vocal e violão), que emenda com “Closer To The Heart” através de notas sintetizadas do teclado de Geddy. No solo de Alex os teclados estão bem mais altos, o legal destas mudanças de mixagem nos diversos shows é justamente acompanhar melhor alguns trechos que aqui ou ali foram gravados mais baixos. A banda emenda também a primeira versão ao vivo conhecida de “La Villa Strangiato”, esta é uma versão anterior a que está no “Exit… Stage Left”, já com as guitarras de Lifeson tomando o espaço do violão acústico gravado em estúdio. Geddy apresenta a primeira parte da canção (“Buenos Nochas, Mein Froinds”) e a seguir propriamente o título da canção. Os teclados novamente estão bem audíveis, Lee acrescenta algumas notas no início da canção. Há um erro claro de Lifeson ao trocar do acorde de Dó maior para o Lá menor antes da hora, em 2:18, mas o guitarrista rapidamente se conserta. Em 4:58, uma ligeira microfonia durante o ótimo solo principal da canção, quando Alex aumenta os drives. Ouve-se melhor uma base de teclado feito antes dos 8 minutos. Esta versão do Pinkpop Festival pode ser encontrada em parte no documentário “Beyond The Lighted Stage”. É incrível ouvir a banda tocando a faixa na íntegra ao vivo quase tão fielmente, lembrando de todas dificuldades que tiveram para gravá-la em estúdio em um passado muito recente. Isso mostra a evolução técnica muito rápida da banda no final dos 70 e início dos 80. A banda se despede naquele instante, antes do bis.

O bis se inicia com “In The Mood”, os agudos de Geddy estão impecáveis. É sempre muito bom ouvir Peart deixando sua marca em uma canção que originalmente não gravou. Também ouvimos no refrão que ao invés de “Hey Baby”, Geddy canta “Hey Cookie”, mostrando o lado bem-humorado da banda. Veremos nos próximos capítulos que esse refrão sofrerá diferentes alterações com o passar do tempo. O baterista acrescenta muito no uso dos contratempos, nas ótimas viradas nos toms. A música emenda no ótimo “Drum Solo” de Neil, com cerca de 4 minutos, mostrando a crescente evolução técnica de Peart que é anunciado por Lee como “A Professor on the Drum Kit”, e dali a banda novamente se despede. Passam-se cerca de 3 minutos de ovação da plateia e pedidos por novas músicas, até que o Rush retorna para finalizar o show com “Something For Nothing.” Lee apresenta a última canção reforçando que aquela era a última noite da turnê de 8 meses. Algumas frases são mais faladas do que cantadas, mas isso não compromete o resultado. O material em cd se segue com uma versão ao vivo de “2112” daquela turnê, de outra data (Tucson, Arizona, EUA ou Offenbach, Alemanha Oriental, não há uma confirmação definitiva). A faixa-título do quarto álbum de estúdio da banda começa trazendo, sem qualquer economia, todos os efeitos iniciais que compõem o clima do conceito da obra. Os agudos de Geddy no começo da canção chegam a distorcer um pouco, tamanha a potência. Novamente há o desencontro entre o vocal e a guitarra no final da parte I. O vocalista quase não consegue cantar a primeira faixa da segunda parte da canção, “The Temple of Syrink”, que tem um delay excessivo na voz durante o refrão. O Wah-Wah de Lifeson também está exageradamente presente durante toda a canção. Notoriamente a captação da plateia sugere um público bem menor do que o presente no festival Pinkpop, algo que provavelmente reflete o que de fato aconteceu. O baixo de Lee traz uma performance realmente endiabrada, mas de forma geral, é novamente uma boa versão da faixa, embora mais “crua” que o restante do cd. Entendemos, porém, que seria melhor que eles trouxessem alguma faixa do álbum recém-lançado, ou “Circumstances” ou a versão na íntegra de “Cygnus X-1 Book II: Hemispheres”. “2112” já fez parte de outros lançamentos ao vivo.

Você pode, se quiser, acessar qualquer das faixas deste cd bônus, enquanto o link se mantém, aqui:

A opção por incluir, mesmo que parcialmente, o show do Pinkpop Festival de 1979 na versão comemorativa do 40º aniversário do lançamento do álbum “Hemispheres” foi nós e pela imensa maioria dos fãs uma ótima novidade. É claro que o áudio já estava disponibilizado em fontes não oficiais, assim o die-hard fã muito provavelmente já tinha conhecimento do material. Nada como ter isso de forma oficial, ainda mais de uma época tão brilhante da banda. O resultado é o esperado mesmo, traduzido na palavra excelência.  A turnê do “Hemispheres” trazia a banda tocando todas as espetaculares faixas do álbum, que conseguiam à época elevar o nível de um show já muito consistente, com grandes músicas, como “Xanadu” ou “2112”. 

É uma pena que o show não esteja na íntegra e infelizmente não se tem conhecimento de um outro show gravado de forma decente e que fosse mais completo da turnê. Ao tocar em um festival, o Rush precisou se adequar ao tempo permitido. Nisso ficaram de fora faixas como as duas partes de “Cygnus X-1”. Também devemos reforçar que escolheríamos outra música para complementar o material do cd bônus que não fosse a já bem registrada “2112”. Esses detalhes são mínimos. O sexto álbum do Rush é um dos maiores de sua carreira, merece qualquer edição de luxo que a gravadora queira disponibilizar. Em breve, teremos mais alguns apêndices de luxo à jornada pelos anos desta incrível banda. Basta aguardar…

keep bloggin’

Abílio Abreu e Alexandre B-side



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