Fala, galera.
Trago por aqui um relato mais que especial do (mestre) Alan Marques. O Alan é o responsável pela unidade Vila Mariana da Bateras Beat (São Paulo), tradicional escola de música com unidades franqueadas por todo o Brasil e exterior, cuja metodologia usada é a do Dino Verdade. Alan toca a escola – e também toca bateria o dia inteiro (mas não acorda cedo :-)), já que também dá aula do instrumento. Atualmente, também é o responsável pelas baquetas do Sangrena, banda de death metal com excelentes influências do gênero.
Apesar desta intro parecer de um post patrocinado, na verdade, não é o caso. O Alan também é meu professor de bateria e, para quem já me viu tocar bateria, pode soar que o cara é ruim – mas eu garanto que os outros alunos dão certo, evoluem, se desenvolvem, portanto, fica claro onde está o problema :-).
Além das aulas, é um cara que conhece muito de música e de rock, hard e metal, com um ouvido apurado (daqueles de mencionar para prestar atenção que Bonham bate as baquetas de suas entradas em Black Dog, do Led, no início da música), e obviamente me enrola bastante antes do início de cada aula (quando consigo ir) trocando uma ideia sempre excelente de música e afins. Os papos poderiam durar horas, sem dúvidas – já imaginaram onde, né?
Confesso que me surpreendi quando em minha última aula, ele mencionou que escreveria o relato que vocês poderão conferir abaixo – até brinquei com ele que “duvidava que ele faria e entregaria até quarta” (hoje), mas não é que, na hora do almoço, pintou um e-mail e uma mensagem já “apressando” a minha leitura?
Ao Alan, que já conhece o blog há alguns anos, as boas-vindas oficiais aqui também de maneira “oficial”… vamos então à vaca fria, ou melhor, uma bela gelada mesmo… ele com o trauma abaixo e outros aqui, como eu, com este e, em escala muito menor, este…
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Por Alan Marques.
O Inesquecível Show Que Nunca Aconteceu
Noite do dia 04 de dezembro de 1998, uma sexta-feira muito chuvosa em Campinas, mais precisamente, no estádio Brinco de Ouro da Princesa, LOTADO. Uma noite inesquecível, claro, como haveria de ser a noite do meu primeiro show do Iron Maiden, com abertura do Helloween e no auge dos meus quinze anos recém completados, mas no final, o inesquecível não seria pelo motivo esperado.
A expectativa para esse show era enorme por vários motivos. O ano de 1998 foi importante para mim, eu comecei a tocar bateria, virei fã de heavy metal depois de 14 anos só ouvindo rock´n´roll clássico como Rolling Stones, The Who, Neil Young, etc, e além disso, esse seria o terceiro show grande da minha vida e o terceiro no ano (os outros tinham sido os Rolling Stones em abril e o Monsters of Rock em setembro, ambos na pista de atletismo do Ibirapuera). Na altura do campeonato, eu já era muito fã das duas bandas do fatídico show em Campinas. Quem abriu as portas do heavy metal para mim ao me mostrar bandas como Iron Maiden, Dream Theater e Helloween, foi o meu primeiro professor de bateria Gian e foi com ele que eu fui nesse tão esperado “show” do Iron em Campinas. Quem me conhece (eu imagino que aqui só o grande e inigualável pai do Ivan Halen, Edu Bianchi), sabe o quanto essa informação é importante tendo em vista que hoje eu sou baterista profissional, professor de bateria e dono de uma escola de bateria, além de tocar em uma banda de death metal chamada Sangrena há mais de 10 anos.
O show estava marcado para começar às 23h00 e eu e o Gian saímos mais cedo de Vinhedo, cidade onde eu morava na época, para chegar tranquilo, estacionar, entrar e pegar um lugar legal. Logo que chegamos, já percebemos algo errado no ar, pois os portões ainda estavam fechados. A chuva já estava torrencial e com o tempo, o pessoal esperando pelo menos que abrissem o portão, começou a ficar nervoso. As horas foram passando e nada do portão abrir e nem da chuva passar, menos ainda de alguém dar alguma informação para o público cada vez mais impaciente. A tensão foi aumentando até que o portão foi derrubado pelo público e todo mundo que estava esperando pra fora entrou, inclusive nós. Apesar do clima, que não era dos melhores em nenhum sentido, entrar foi um alívio, principalmente ao ver o palco montado com instrumentos e tudo. A primeira coisa que me chamou a atenção, mesmo sendo praticamente novato em shows, foi a forma em que o palco estava montado. Ele estava no meio do campo e virado para a lateral do estádio, ou seja, a pista era curta e muito larga e a arquibancada bem perto do palco. Toda a parte de trás do palco era tapado com tapumes de madeira que iam de um gol ao outro. Não é uma montagem muito comum para shows em estádio.
Já lá dentro, na pista e posicionados em um bom lugar para ver o show, fomos ficando cada vez mais preocupados. A tempestade parece que ficava cada vez mais forte com raios e trovões cortando o céu e muito tempo ia passando sem que nada acontecesse. Para piorar a situação, o pessoal da arquibancada começou a jogar garrafas de plástico na galera da pista que por sua vez, não ficou nem um pouco feliz e com isso o nervosismo foi chegando a um limite extremo. Por sorte nós não levamos nenhuma garrafadaa na cabeça para descobrir o que tinha dentro delas. Um bom tempo depois, quando a situação já era insustentável, finalmente apareceu alguém da produção, provavelmente um infeliz que perdeu no cara e coroa para decidir quem ia dar a notícia que ninguém queria ouvir, e aí aconteceu um dos três momentos que eu me lembro como se fosse hoje, apesar dos quase vinte anos passados. Ele pegou um microfone e começou a falar a seguinte frase: “É notório que estamos com problemas e infelizmente o show terá que ser cancelado.” A frase foi curta porque no final do “infelizmente”, eu comecei a ouvir barulho de ferro batendo em ferro, de coisas quebrando e muita, muita coisa sendo arremessada no palco. Tudo imediatamente após o “infelizmente” do infeliz funcionário que saiu correndo para se esconder. Esse barulho de ferro batendo em ferro, eu ouço em minha cabeça como se tivesse sido ontem.
Aí a coisa degringolou de vez! O quebra-quebra foi generalizado e nós que não tínhamos intenção nenhuma de quebrar nada, imediatamente começamos a procurar uma forma de sair o mais rápido possível dali. Eu vi o medo na cara do Gian, muito mais do que na minha, porque naquela situação absurda, ele ainda era o meu responsável naquela noite. A entrada, que agora era uma saída, era estreita e logo ficou intransitável. Nesse momento um cara deu uma voadora num dos tapumes que separava a pista do fundo do palco e derrubou uma parte dessa divisão. Foi aí que nós vimos uma oportunidade junto com outras pessoas que tiveram a mesma ideia: “vamos sair por trás do palco”. Ao passar por trás do palco, que tinha bem menos gente do que na frente, aconteceu o segundo momento inesquecível. A bateria do Nicko estava montada e descoberta, e no meio de toda a adrenalina e instinto de fuga, foi realmente incrível ver aquela batera maravilhosa, linda e enorme bem de perto. Para um batera de 15 anos e fã do Iron, isso é uma coisa rara e muito marcante.
Passado o pequeno deslumbramento baterístico, veio logo o terceiro momento difícil de esquecer e praticamente antagônico ao segundo. Quando nos aproximávamos da saída, já abarrotada de gente, nós cruzamos a tropa de choque entrando no estádio, já no famoso gramado do Brinco de Ouro da Princesa. Se o motivo deles fazerem isso é causar um efeito psicológico em quem está em volta, eu posso dizer que funciona. Eles estavam marchando, formando duas grandes filas indianas e em cada passo, batendo os cassetetes nos escudos como se fosse o metrônomo da morte. O barulho das batidas bem sincronizadas junto ao visual meio apocalíptico dos caras todos de cinza escuro com capacetes, escudos, escopetas e cassetetes, é bastante impressionante. Depois de um grande empurra-empurra para sair meio no desespero, nós acabamos dando uma grande sorte de conseguir sair logo e corremos para o carro antes de poder pensar naquilo tudo. Foi tudo no instinto.
Eu digo sorte porque a coisa ficou muito feia para quem demorou um pouco mais para sair e muita gente apanhou da polícia dentro e nas imediações do estádio, inclusive alguns amigos meus que não estavam junto da gente naquela noite mas que eu pude ver o roxos nas pernas e braços na semana que se seguiu. A polícia, extremamente despreparada para aquela situação, exagerou muito na reação aos fãs indignados por passar tantas horas debaixo de chuva fortíssima, sem informação nenhuma e ainda tendo o show cancelado. Eles não economizaram porrada de cassetete, balas de borracha e bombas de efeito moral. Dois desses amigos que apanharam, que são irmãos inclusive, eu posso afirmar que eram 100% inofensivos naquela situação. Pessoas totalmente da paz, mas que sofreram com o sadismo e ignorância da polícia que na frente deles, viam só um monte de “metaleiros baderneiros” e assim, saíram batendo em todo mundo que passava pela frente.
Depois de tudo, ainda rolou uma conversa na imprensa de que o show poderia ser remarcado, mas isso não aconteceu. Para quem conseguiu “salvar” o ingresso em meio àquela noite caótica, teve o valor reembolsado (na época, a pista custou incríveis R$ 30,00, que não era barato). Esse não foi o nosso caso. Na confusão da entrada, nossos ingressos já molhados foram embora. Algumas informações que saíram na imprensa depois do incidente falavam em 6 mil pessoas presentes, que a produtora avaliou o prejuízo em R$ 200.000,00, que boa parte do equipamento e do estádio foi destruído além de carros que estavam parados nas imediações e que vários feridos foram levados ao hospital após a confusão. Ainda dizia que a banda sobrevoou o estádio duas horas antes do horário previsto e decidiu não realizar o show por causa das condições climáticas e técnicas.
O meu primeiro show do Iron Maiden acabou sendo o do Rock in Rio 2001, que, diga-se de passagem, foi um show histórico. O Helloween eu pude ver no mês de junho do mesmo ano do Iron, no infelizmente demolido Via Funchal. Hoje é uma boa história para contar, naquela noite, nem tanto, mas com certeza foi inesquecível. Não sei se mais ou menos do que teria sido se tivesse acontecido o show, mas eu posso dizer com certeza que o bagulho foi louco!
Fotos encontradas na internet:
Alan.
Categorias:Artistas, Backstage, Cada show é um show..., Curiosidades, Helloween, Iron Maiden, Led Zeppelin, Resenhas
Alan, muito obrigado por compartilhar essa historia
Nossa, que confusão
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Comentários do post nesta thread – Twitter:
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Cara, eu nunca soube que isso tinha acontecido. E, é claro, me fez lembrar o show “da grade” no Rio, que foi cancelado. Outra coisa que achei estranho é o Iron cancelar um show por condições climáticas. Não lembro de existir um precedente nisso, inclusive sei de várias bandas que enfrentaram condições bem adversas e ainda assim fizeram o show. No caso do Iron, peço a ajuda de vocês para saber se houve situações como essa.
Imagino a frustração, mas pensando bem, em 98 seria a tour do Virtual XI???? Então por um outro lado, há males que fazem bem, pois a sua estréia foi num show magnífico, o do Rock in Rio. Eu nem preciso comentar sobre a questão vocal, certo ? E ainda teve pelo menos o consolo de ver mais de perto a batera do Nicko, ainda que desmontada.
Valeu pelo post !
Alexandre
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Não lembrava do fato também. Depoimento impressionante. Sobre questões climáticas posso te dizer que os americanos (e britânicos, suponho) levam muito a sério o que eles chamam de tempestade elétrica. Já vi jogos de futebol americano serem interrompidos por ameaça de tempestade com raios. Fazem as pessoas todas irem para a parte interna do estádio e o jogo é retomado depois de passados os raios.
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Eu e mais 8 amigos estávamos nesse “show Inesquecível”, foi assim mesmo que aconteceu
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Cara, perfeito! Eu estava lá, vieram 2 amigos meus de MG para ver o show, apesar de não ter acontecido, foi uma noite realmente inesquecível. Depois, nós 3 também com mais 15 amigos vimos o Iron no Rock in Rio de 2001, com a volta do Bruce, dia 19/01/2001, lembrando que no show que teria em campinas o vocalista era o Blaze. valeu, um abraço.
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Vander, seja bem-vindo ao Minuto HM. Valeu pelo comentário e continue participando por aqui.
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Eu também participei deste quebra pau.
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