Iron Maiden – Live at Dynamo Open Air Festival – June 3rd, 2000 – Goffert Park, Nijmegen, Holland

Após o anúncio do retorno de Bruce Dickinson e Adrian Smith, o Iron Maiden realizou a Ed Hunter Tour e retornou aos estúdios de gravação. Em junho de 2000 o agora sexteto havia acabado de lançar Brave New World, seu primeiro álbum com a nova formação. Eu, então com meus 17 anos, sonhava com meu primeiro show do Iron Maiden. Não tivera a oportunidade (ou idade) de acompanhar as passagens com Blaze e até com o próprio Bruce na década anterior, e confesso que o amor e a admiração pela banda (assim como um maior conhecimento de toda a discografia) havia surgido apenas nos poucos anos anteriores.

De qualquer forma, vivia a expectativa do anúncio de datas da tour sul-americana. Boatos cravavam ao menos um show em São Paulo em setembro daquele ano. A ansiedade era muita, e todos os dias eu acessava o Bulletin Board do site oficial e na saudosa Seventh Page em busca de novidades, sem muito sucesso. Eu era novo de internet: onde morava a rede de telefonia era medonha, e era quase impossível navegar de maneira minimamente decente com meu modem de 33.6k. O pouco que ficava sabendo aumentava ainda mais a ansiedade: como ficariam as músicas da era Blaze na voz de Bruce? Sério que em “Sign Of The Cross” Bruce é erguido no palco em uma cruz? “The Nomad” ao vivo, será?

Foi quando durante um de meus semanais passeios à Galeria do Rock vi em uma vitrine um álbum do Iron Maiden que não conhecia. Reconheci o logotipo de longe, e estranhei a presença das ‘perninhas’: era “Live At Dynamo Open Air Festival”. Não sabia ainda, mas eu estava sendo apresentado ao meu primeiro bootleg. Entrei, olhei o CD com estranha admiração. Pela primeira vez vi o setlist da tour. Vi a data: três de junho. Era apenas o segundo show da Metal 2000. O preço de 50 Reais (e a ausência de The Wickerman – o vendedor não soube explicar o porquê), proibitivo na época, me fez ir embora sem levá-lo.

Uma semana pensando no assunto. Novo passeio à Galeria, desta vez com meu irmão. Embora não tivéssemos encontrado o CD na mesma loja, encontramos uma versão com capa diferente, em outra. Set list completo, desta vez, por trinta Reais. Há quinze anos CDs originais importados eram vendidos por 25, e nacionais por 15, 18 Reais. Eu e meu irmão rachamos aquela pequena fortuna e levamos o CD duplo, bem acabado, cheios de expectativas.

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É difícil descrever. Ouvia pela primeira vez um registro ‘puro’, honesto, sem edições e com todas as falas e todos os erros. Sim, erros, e não são poucos. Como falei acima, era apenas o segundo show da tour do novo álbum, e podemos dizer que a banda ainda estava em período de entrosamento. São notas que falharam, pratos que soaram estranhos, desafinadas, letras esquecidas e muito mais. A cada nova sessão com o álbum descobríamos um novo detalhe, alguma nova particularidade.

A começar pelas condições do show. Aparentemente o dilúvio sobre o Goffert Park em Nijmegen naquele dia foi similar ao que vimos no show de 2009 em Interlagos. Bruce, em noite inspirada, caprichou nos xingamentos e palavrões em todos os momentos. Este bootleg em algumas de suas versões inclusive é chamado de “Fuc* The Rain”. Bruce invoca em alguns momentos a “ira de Deus”, principalmente durante “Sign Of The Cross”: “Por que não manda um pouco mais de chuva? Alguns raios seria legal. Talvez também um terremoto!”. Menciona também que “adorável clima escocês que temos aqui”, antes de “The Clansman”, e ao final pede desculpas por não terem todo o equipamento da tour (nem Eddie, nem Wicker Virgins) exatamente por causa do clima e da estrutura (“[…]a filthy fuc**** night without any conditions[…]”).

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Os erros são diversos e não vou estragar a diversão de percebê-los. Vale a pena ouvir e entender que a banda é de fato formada por seres humanos, afinal, que também erram. Menciono apenas dois momentos em que eles ficam mais evidentes: Bruce se atrapalha nas letras de “Dream Of Mirrors” e ainda comenta com alguém que “Sério? É assim que é a letra? Ah, entendo”; E o momento mais bizarro é na primeira estrofe de “The Number Of The Beast”. Bruce para de cantar e começa a rir e a gritar algo como “no, no, lady, no”, e ainda diz um “desta vez você estragou tudo”. Na sequencia ele erra bizonhamente a letra da música, e emenda “I’m fuc**** up with the words now”. Na época comentavam que uma pessoa invadiu o palco. Outros disseram que Nicko saiu da bateria e perseguiu Bruce, por causa de uma brincadeira com seu aniversário (Nicko faria 48 anos dali dois dias). Nunca soube com certeza.

Hoje, quinze anos depois e com toda a tecnologia que temos, o show pode ser facilmente conferido online, como podem ver abaixo. A versão que tenho em CD, no entanto, é superior em termos de qualidade, embora tenha alguns cortes entre as músicas.

Como todos sabemos o show em São Paulo naquele ano não aconteceu. Tivemos no Brasil apenas o show de encerramento da tour, no Rock in Rio, naquele memorável 19 de janeiro de 2001. Depois de meses de tortura e indefinições, sim, eu e meu irmão estivemos lá, vivendo uma verdadeira saga para finalmente ver a banda ao vivo (e espero contar também esta história em uma outra oportunidade).

“Mas o que te levou a fazer uma ‘pseudo-resenha’ de um bootleg, afinal?”

Talvez até mais que muitos álbuns de estúdio, este despretensioso bootleg faz parte da minha história com a música por ter me ajudado a segurar a ansiedade antes de meu primeiro show da minha banda favorita. Até hoje eu e meu irmão, em nossas reuniões, com prazer colocamos o Dynamo para tocar e cantamos junto, inclusive (na verdade, principalmente) os erros e falas. Diversão garantida e certeza de boas lembranças.



Categorias:Bootlegs, Cada show é um show..., Curiosidades, Iron Maiden, Kiss, Músicas, Resenhas

4 respostas

  1. Nunca soube o porquê da gravação do Dynamo. Não era comum termos bootlegs de shows até então. Descobri depois que este show havia sido televisionado, como acontece hoje com os grandes festivais. E consegui encontrar os seguintes vídeos, curiosamente postados por uma colega de fórum da saudosa Seventh Page (antigo domínio http://www.ironmaiden.com.br):

    The Wickerman

    Ghost Of The Navigator

    Brave New World

    Wrathchild

    Two Minutes to Midnight

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  2. Incrível e emocionante o depoimento. Um áudio de um registro ao vivo literalmente dissecado por você, Caio e seu irmão, tantas foram as audições. E assim faz todo o sentido que este bootleg tenha este especial lugar nas suas lembranças e no seu coração.
    Vi os vídeos todos, ainda não ouvi o áudio ( mas reservarei um tempo para tal).
    Muito bom ver a banda ensaiando os seus passos em direção ao futuro que hoje se perpetuou em mais de uma década e meia de sucesso e bons registros de estúdio, além de incontáveis projetos ao vivo. O propósito aqui não é comparar com esta ou aquela fase e sim celebrar quantas faixas boas a banda conseguiu nos entregar nesta sobrevida que dura tanto tempo ( e que,esperamos , dure muito mais)

    Up the Irons, my friend!!!

    Parabéns pela excelente resenha ( que de pseudo-resenha não tem nada)!!!!!

    Alexandre

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  3. Muito legal Caio. Eu lembro desta época – o retorno do Bruce, o que achei que não aconteceria e graças a Deus aconteceu. Lembro de ouvir gravações ao vivo de 1999 já com o sexteto e que alívio, que diferença.
    Já falamos 200.000 vezes aqui, mas o que aonde o Harris estava com a cabeça ao escolher o Blaze.
    Não que o Blaze fosse ruim em seus trabalhos, mas nunca poderia ter sido escolhido para cantar as Hallowed by thy names da vida..
    Eu já tive piratas em fita cassete, e entendo o papel do bootleg. Acabei de “adquirir” um do Scorpions Uli Roth era. Os piratas são muito importantes, trazendo a sensação da banda mais humana. Só para destacar – uma formação excelente do Kiss – com Ace e Eric Carr nunca teve registro oficial ao vivo – eu lembro de um tal EGO´S AT THE STAKE em 1980, um pirata muito conceituado – que tinha numa fita cassete cromo 90 (sic). Acabei comprando na galeria depois em CD-R, temos até hoje.

    Bom, depois disso tudo, quero parabenizá-lo pelo registro em excelente post e veja como nos traz às lembranças de situações similares.
    Aguardamos seu próximo post e cade você no podcast?
    Abraços
    Remote.

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  4. Fala, Caio… primeiro, as mais que necessárias desculpas pela monstruosa demora em comentar neste post…

    Cara, como temos praticamente a mesma idade, eu mais que me identifiquei com praticamente tudo que você traz e viveu. Lá estava eu, sem te conhecer, passando praticamente pelas mesmas dúvidas e incertezas da época… de diferente, eu tive a oportunidade de ver o Maiden com Blaze em 1998, aquele show em dezembro que foi aniversário antes da 89.1 FM acabar (e hoje ela já até voltou). Preciso de um post deste show à parte.

    Vi o Bruce também (com Adrian e Roy Z) no show extra que acabaria virando o Scream For Me Brazil. Eu não tinha dinheiro para ir a este show (eu não fui no da quarta por isso), porque tinha comprado ingresso pro Kiss e pro MetallicA. Eu ganhava R$ 90,00 por mês líquido. Outra época que tenho que voltar para escrever sobre…

    Ahhh, a Seventh Page… eu também a acessava diariamente, assim como o Whiplash… aquilo era muita modernidade. Eu, que buscava conteúdo de música em diretórios de da BBS do STI, Mandic, etc, era uma verdadeiro privilégio acompanhar aquilo ali. Cara, que época boa… eu estava entrando no Mackenzie, meu primeiro ano de faculdade. Eu tinha um discman e nesta época, junho, já havia sido apresentado a meu futuro primeiro MP3 player portátil (porque o formato MP3 eu já conhecia desde 1997 – vantagens de se ter amigos nerds – ou ser um, sei lá). Eu não conseguia guardar nada naqueles 8 MB do Gradiente, mas era demais… baixava a qualidade da música, claro, hahaha.

    Sobre o bootleg, a banda estava perdida, isso que é verdade. Eles se “acharam” mesmo a partir de 2001, quando vejo que a formação e as 3 guitarras se “estabilizaram”. Naqueles primeiros shows, era uma bagunça. Esse bootleg deste show mostra bem isso. É sensacional ler seu relato e de novo, como me identifico, parece que fui eu que escrevi, é muito legal.

    Deixo aqui uma outra “marca” que tenho certeza que você deve ter… quando do anúncio do retorno do Bruce e Adrian, lembro de ficar aguardando ansiosamente – e basicamente me fazendo as mesmas perguntas que você: “sério que tem a cruz?” ; “será que Bruce vai cantar coisas do Blaze?”… e uma das coisas que eu mais queria na época era ver Bruce cantando no Iron Maiden de novo, seja qual for a música. Parecia para mim, na época, que não seria algo definitivo, era uma sensação estranha. Eu custava a acreditar, afinal, eu tinha “acabado” de ver o show solo de 1999 no agora extinto Via Funchal… era tudo muito estranho.

    Mas não deixei nem falei da marca. Ela é Man On The Edge ao vivo em Milão, em 1999, como parte da tour que você comenta no início, Ed Hunter (aliás, como custou CARO na minha vida comprar o triplo, eu lembro que foi um sofrimento financeiro enorme comprar o CD, 100% do meu bolso). Eu tenho essa música na cabeça como se fosse agora que estivesse ouvindo. Soava muito diferente para meus ouvidos na época, e eu estava efetivamente vivendo, já com um entendimento “maior” de música, o IRON MAIDEN COM BRUCE DICKINSON. E isso abaixo foi a primeira coisa que eu ouvi, me marcou demais, me emociono até…

    Eu tenho aqui, na cabeça, como se fosse agora, eu vibrando como se tivesse ganhado na loteria quando acabei de ouvir a primeira vez a música… cara, é como se eu tivesse vivendo de novo, AGORA… eu comemorei, eu me emocionei com a voz do Bruce… e o final da música? O que era aquilo? Eu lembro de ter pensado: “%#%#$%#$, AGORA SIM, AGORA SIM, AGORA SIM”. E estava também feliz pelo retorno do Adrian e manutenção do Janick, já que cresci ouvindo, depois do Live After Death, o Real Live Dead One mais do que eu escovava os dentes… eu escutei essa versão até saber cada fala do Bruce, cada detalhe, ouvir aquela bateria do Nicko (especialmente a caixa) alta e marcante, o baixo alto de Harris antes do refrão, os solos, a sujeira de Janick no segundo solo, Murray deixando sua marca no último… era um sonho novamente virando realidade…

    Bom, isso me fez refletir de que sim, estamos ficando velhos e sim, precisamos de mais e mais histórias como estas neste blog. Muito obrigado por trazer esse “pedacinho” da sua… e nos conte mais e mais…

    E também, como disse o Remote, falta você no podcast…

    Muito obrigado de novo.

    [ ] ‘ s,

    Eduardo.

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