Estar em uma capital mundial como Londres e conseguir aproveitar bem o normalmente escasso tempo requer uma série de coisas, entre elas planejamento caprichado, disposição física e mental absolutas para encarar mudanças climáticas e, como tudo na vida, uma boa dose de sorte para o planejado virar realizado.
Londres é uma daquelas cidades “infinitas” em termos de opções. Ela pode ser até considerada e conhecida como a cidade mais cara do mundo (e realmente é cara), mas não faltam opções, especialmente seus impressionantes e riquíssimos museus, totalmente free of charge. Assim, para se sair do “melê” de tantas atrações e ir mais zonas e bairros mais distantes, é necessário ter-se uma motivação importante.
Qualquer um que escuta heavy metal, e acaba sabendo um pouquinho da história das bandas inglesas, sabe que as mais tradicionais do estilo não saíram das partes “ricas”. Desta forma, normalmente é necessário para aquele que quer conhecer as raízes ter que se afastar da “beleza royal” e ir para lugares como o East End.
Ir ao Cart & Horses é um sonho de qualquer maidenmaníaco. Havia um receio meu em dar alguma “zica”: encontrar o lugar em reforma, com show rolando, evento privado, fechado provisoriamente, definitivamente… afinal, o pub está longe de figurar na internet como um “must see” da cidade, mesmo em lista de lendários pubs – e não é por menos, já que Londres tem literalmente “trocentas” opções onde você se sente fazendo parte da história do mundo.
Tentei entrar em contato com o pub. Por telefone, Twitter, enfim, não consegui nada. Nesta época de inverno, com o sol se pondo em torno das 16h15 (às 16h30, parecia meia-noite, de tão escuro que fica). No site oficial, dá para saber que há shows de sexta e sábado, mas a agenda parou em abril/2015. “Configurei” minha expectativa então de ir e ver no que daria, nem que fosse apenas ver a fachada do pub ou ainda do pequeníssimo hotel 3 estrelas de mesmo nome, que fica em cima do pub.
A ida para lá foi de metrô, aliás, como praticamente todos os lugares que fui na cidade, aproveitando a fantástica, inteligente e mais que centenária malha ferroviária. A estação mais próxima do Underground é a Stratford, e há 3 linhas de metrô passando por esta estação. Depois de uma boa “andada”, ao chegarmos lá, minha esposa e eu percebemos, ao fazermos a rota a pé pelo Google, que seria melhor ainda se andássemos mais uma estação, só que de trem (TfL Rail), descendo na Maryland Station. A estação Stratford é gigantesca, conectando várias linhas de metrô e trens, inclusive na parte dos trens a estação faz conexões internacionais.
A experiência em se sair das principais zonas da cidade é parar de ver turistas e passar a “sentir” como é realmente a cidade. Londres é uma cidade riquíssima: no centro, só se vê automóveis de primeiríssima linha, pessoas vestidas com o que consideramos “a melhor roupa da vida”. No East End, realmente é possível ver o outro lado da coisa, a barra fica “mais pesada” – dá para efetivamente sentir como era o clima inclusive nos anos 1970 / 1980…
A decisão em andar de trem e descer na Maryland mostrou-se a melhor de todas, já que o Cart & Horses fica literalmente a uma quadra da estação. Ao sairmos, erramos o lado, em um clima frio com fina garoa (pleonasmo total). Quando o sinal do celular estabilizou, voltamos à saída da estação e já deu para ver o o pub. Eram 15h30, a noite já começava a dar seus primeiros sinais de que estava chegando e ventava bastante.
Ainda do lado de fora, foi possível ver que o pub estava aberto e, em uma rápida olhada por fora mesmo, não consegui ver ninguém do lado de dentro, fato que se confirmou ao entrarmos…
Confesso que a partir dali foi uma alegria e um nervosismo só da minha parte. As fotos do lado de dentro não ficavam boas, eu comecei a ter uma “pressa” enorme causada pela ansiedade. Quando entrei então, o nervosismo só aumentou – tirei um monte de fotos e depois apaguei a maioria, tendo que refazê-las, depois que passou o pico da adrenalina – e eu, que não tomo cerveja, abri uma justa exceção, pedindo uma Trooper, obviamente :-).
Do lado de dentro, foi possível notar como o pub realmente usa da história com o Iron Maiden para se sustentar: toda a decoração do lugar é relacionada ao Iron Maiden: são fotos, camisetas, LPs, quadros, posters, faixas… e o pub funciona como praticamente todos na cidade: você vai até o balcão, pede o que quer, paga na hora e leva para a mesa sua bebida. O bar possui diversas “ales”, mas a Trooper draft, ali, é por motivos mais que óbvios o atual carro-chefe do bar. As opções para comer também são boas, com o clássico inglês Fish & Chips sendo parte do cardápio. E o ambiente interno (o Cart & Horses possui ainda uma área externa ao fundo) é diferente do que eu imaginava – é bem agradável, confortável, limpo e com tudo organizado.
Mas o grande “destaque” é mesmo o pequeno e lendário palco, do lado esquerdo de quem entra e do lado direito do bar do pub – afinal, é ali que nasceu o grande orgulho da história do heavy metal da cidade e, hoje, do mundo.
Durante a hora que passamos ali, apenas uma garota chegou e ficou sentada sozinha, tomando uma cerveja. Isso porque um grupo de prováveis menores de idade também entrou, se sentaram e, pouco tempo depois, foram educadamente convidados a se retirarem. Antes de sairmos, chegaram mais 3 caras, fãs da banda, que timidamente não estavam tirando fotos. Quando eles viram o que eu estava tirando de foto e fazendo vídeo, confessaram para a gente que “inspiramos” eles a subirem também no palco e sair fotografando o local. Não tem jeito: a vontade de subir naquele mini-palco, estando ali, é impressionante.
Conversei rapidamente com a bartender, perguntando para ela como era normalmente o movimento do pub hoje em dia. Ela disse que o movimento continua bom, mas é mais local, exceção, claro, aos fãs da banda, que vêm do mundo todo visitar o lugar. Perguntei se eles recebiam fãs todos os dias, e ela me disse que não, mas que dá para dizer que um dia sim, outro não, em média. Questionei ainda se ela gostava de Iron Maiden, se conhecia algo da banda, e ela disse que não gostava “tanto” e que conhecia o básico do que via ali dentro e tanto ouvia falar dos fãs (hehehehe). De qualquer forma, era uma pessoa bem simpática, mas também a provável responsável de no som e nas TVs do pub estarem tocando umas músicas pop de qualidade, digamos, duvidosa.
De resto, foi curtir o local naquela quinta-feira, 12/nov/2015, deixando a câmera também de lado por um certo tempo, tomando a Trooper e andando onde o Iron Maiden nasceu!
Para fechar: é mais do que viável viajar para a Inglaterra “apenas” para ver lugares relacionados à música. Mesmo sendo bastante óbvia tal frase, eu gostaria de reforçar: é MAIS DO QUE POSSÍVEL fazer apenas isso. É difícil, entretanto, fazer isso em uma primeira vez, especialmente em Londres, com tantas coisas a conhecer. Portanto, as variáveis tempo e planejamento, novamente, são fundamentais.
Ah! Sim, há outro lendário pub no East End, próximo ao Cart & Horses, que o Iron Maiden também tocou lá no início de tudo: o The Ruskin Arms. Mas deixemos para um próximo post :-).
[ ] ‘ s,
Eduardo.
Categorias:Cada show é um show..., Curiosidades, Iron Maiden
Mais uma vez você fazendo historia aqui nesse blog
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Rolf, é um lugar lendário é que merece mesmo uma visita. Eu confesso que imaginava um lugar meio “acabadão”, e me surpreendi positivamente.
Que tal um podcast do blog ao vivo por lá? Todos nós juntos? Quem sabe um dia…
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Sensacionais as fotos e a ‘performance’ no palco! Eu confesso com certa vergonha que não conhecia a história do Cart & Horses. Estive em Londres em 2002, e fiz um trajeto similar ao East End para conhecer o Ruskin Arms. Engraçado, eu fiz exatamente as mesmas coisas, desde as fotos na fachada até a subida no palco. As referências ao Iron Maiden, no entanto, eram muito poucas lá, ou relativamente irrisórias se compararmos com o que vejo aqui nas fotos. Eu tenho poucos registros (ainda viajava com câmera de filme, não digital, e não tinha como saber se as fotos ficaram boas), mas vou procurá-los e digitalizá-los para mostrar a vocês (provavelmente no próximo post). Um abraço!
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Caio, não acho ser nenhuma vergonha isso, afinal, estando onde estamos, já há uma barreira geográfica mesmo – sem contar as informações que nem sempre batem. E creio que somos “jovens” ainda em cruzar o que um dia era um mero detalhe, uma coisa distante (tipo ler em algum livro ou algo assim onde a banda tal começou sua carreira, tocou no bar X e Y) com a seguinte possibilidade: “esse lugar ainda existe e tem alguma ‘conexão’ com este passado de décadas atrás”?
E sobre o Ruskin, é bem como você disse sobre as referências e foi para lá que o passeio continuou neste mesmo dia. Ainda trarei por aqui.
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Eduardo, excelente a cobertura, e obrigado por me colocar em Londres, onde a história da donzela foi inicialmente escrita.
É de estarrecer o tamanhinho do palco e ver o que eles acabaram por se tornar….
Imagina hoje em dia se eles resolvem aparecer por lá e matar a saudade…Impossível mesmo….
As fotos são ótimas, o texto, espetacular.
Que venha a sequência das aventuras na capital inglesa, mal posso aguardar !
Alexandre
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B-Side, é um grande prazer poder trazer algo por aqui para autoridades que tanto estudam as raízes do estilo que tanto gostamos, sendo obviamente o Iron Maiden um dos principais expoentes. Então, mais do que simplesmente ir ao pub, é pensar nisso também.
Sobre eles voltarem lá, acho bastante difícil caber que seja metade do kit do Nicko, hehehe.
Valeu mesmo e aos poucos vou tentando soltar mais coisas que possam trazer um pouco da capital inglesa!
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Oportunidade,
a gente não pode deixar isso de lado. Por isso já disse inúmeras vezes que todas estas viagens e momentos devem ser eternizados em um livro com fotos e curiosidades que possam passar batidas no blog. É sempre bom quando você compartilha isso com a gente, é um tesouro dividido com a gente.
A Inglaterra respira historias, lendas e inícios. Neste aspecto acho-a encantadora. Quem sabe um dia a gente pode todo mundo se reunir e fazer o maior podcast do mundo de uma das cidades mais bacanas e importantes para história do rock.
Um grande abraço,
Daniel
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Daniel, é isso mesmo. Não é fácil “aproveitar” oportunidades como esta, pois não é tão “trivial” simplesmente arriscar ir a um lugar como estes estando com zilhares de opções à frente em uma cidade como Londres.
Pode parecer bobo o que disse acima, mas não é. Em viagens, muitos visitam lugares “apenas por visitar”, só porque “é famoso ou todos vão” – e muitas vezes, tais lugares nada significam para a pessoa, ou passam em branco… pode crer que, este lugar, já afastado do “melê” de tudo, eu jamais esquecerei…
A ideia sobre livro e tudo mais é bem legal, mas não acho que encheria muito ainda tantas páginas… quem sabe um dia? 🙂
Sobre o podcast, pois é, quem sabe um dia também… seria surreal.
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Emocionante o post. Minucioso, completo e pra lá de pertinente. Já vai pra lista de “points of interest” londrinos.
Presidente, achei que iria recomendar a bartender uma alteração na trilha sonora do local.
Aguardo os próximos!
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Xará, vindo de você, grande conhecedor e fã da banda, além de enorme conhecedor de “como viajar”, fico grato pelas palavras e pelo “to do” do seu lado. Só não esqueça de me convidar, ok? 🙂
Olha, vontade não faltou realmente de questioná-la, ou de perguntar se ela não tinha um Live After Death para tirar as porcarias que tocavam…
Este foi especial, mas próximos virão!
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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