Max Cavalera x Mike Portnoy – Escolhas erradas, vidas frustradas

Comentários Eduardo:

Pessoal, este é um dos três textos que ficaram como “rascunho” aqui no blog do Daniel. Eram três alternativas e espero estar escolhendo a “melhor” delas neste momento:

  1. apagar os textos (cito apenas pela necessidade de mostrar as opções);
  2. nos atrevermos (eu ou alguém) a editar os textos no sentido de “finalizá-los” / “completá-los” e publicá-los;
  3. apenas publicar os textos, da maneira como o Daniel os deixou, com a opção de nos comentários deixarmos nossas palavras. É a opção escolhida. Eu, que normalmente edito TODOS os textos por aqui, abro exceção ao não mexer neste, apenas colocando os links que o Daniel tanto gostava também.

A última edição do Daniel no texto abaixo foi feita em 25/setembro/2016. Post número 50 de 51.

[ ] ‘ s,

Eduardo.


Max Cavalera e Mike Portnoy são ídolos e ícones de uma geração de rock. Fundadores de bandas consagradas, ambos possuem liderança, técnica, carisma e bastante histórias para contar. O primeiro se destacou por criar o que para alguns era a melhor banda de metal no Brasil. Pelo menos até o”Roots” (1996), ninguém conseguia apontar um grupo que tivesse conseguido ultrapassar a fronteira do país e feito história, chamando atenção de gente grande do meio como Ozzy Osbourne. Os irmãos Cavalera, ainda moleques, seguiram seus sonhos e gravaram o primeiro disco em 1986: “Morbid Visions” ainda traz a sujeira e a influência do death metal, primeira fonte bebida pelos garotos. A banda que este ano fez 30 anos de carreira iria despontar com o excelente “Arise” em 1991, o disco que iria catapultá-los como um dos maiores representantes do thrash metal da época.

Sepultura explodiu naquele ano e passou a ocupar as revistas especializadas do mundo inteiro. Seu som tribal, misturado ao peso das guitarras de Max e Andreas (que substituira Jairo Guedes), destoavam do cenário metal vigente. Se era comum a parede de guitarras graves e muita velocidade nos compassos, na banda mineira além dos ingredientes já conhecidos, um tempero de “batuque” brasileiro deixava os gringos malucos com as possibilidades. No auge da criatividade, após lançarem o seu disco mais “diferente” (Roots), em um trabalho de pesquisa que rendeu à banda todo o reconhecimento que consolidava seu espaço como uma das maiores do mundo, Max sai da banda após conflitos que envolviam discussões sobre a maneira como sua esposa, Gloria Cavalera, administrava os negócios da banda. O trauma fora imenso, mas Max saiu sozinho e deixou 3/4 da banda com a missão de recomeçar.

Ele também re-começou sua carreira com o Soulfly (com enormes influências do hibridismo da sua antiga banda) e logo abraçaria outros projetos, abrindo portas em festivais como o “ex-guitarrista e vocalista” do Sepultura. Com moradia nos Estados Unidos (Max hoje tem dupla cidadania), lá se aproximou de seus pares e deu continuidade à carreira, em uma proporção menor do êxito que seu grupo alcançara.

Mike Portnoy foi aluno da Berkelee College of Music (por onde já passaram Abe Laboriel, Bruce Hornsby, John Mayer, entre tantos) onde conheceu John Petrucci e John Myung; com eles formaria o Majesty, mas ficaria famoso mesmo como Dream Theater. Se “When Dream A Day Unite” (1989), disco de estreia, não chamou tanto atenção do público, foi com “Images & Words” (1992), já com James LaBrie no vocal, que o grupo despontou como a referência mais popular do estilo que viria a ser chamado de Prog Metal – a junção da velocidade e peso do metal, associado à técnica precisa e purismo do progressivo.

Não só Portnoy, como os outros integrantes, passaram a aparecer nas listas de “melhores músicos” ano após ano. Com liderança e carisma, Mike Portnoy segurou a barra da banda até em momentos críticos como em 1997, no lançamento de “Falling Into Infinity”, último álbum do tecladista Derek Sherinian, a banda quase se separou. Foi tão fundamental esperar a poeira baixar, que com o lançamento de “Metropolis pt. 2: Scenes From a Memory” do final de 1999, a banda ganharia status de “grupo grande”. Este disco seria um dos preferidos nas listas do fãs seminais da banda, ao unir com muita sobriedade melodias de fácil conquista, temática sombria e delicada e canções como “The Spirit Carries On” e a clássica “Dance of Eternity”.

Mas o dia 8 de setembro de 2010 reservaria um dia triste na história da banda: alegando cansaço físico e desgaste artístico, Mike Portnoy resolveu deixar a banda que ajudara a fundar ainda menino (tal qual como Max) e pôs fim a um casamento que muita gente jamais imaginaria. Se os motivos “oficiais” envolviam as discordâncias quanto às decisões a serem tomadas no próximo inverno (a banda queria entrar em estúdio e gravar o sucessor de “Black Clouds & Silver Linnings”), muito se falava sobre o desgaste de relacionamento entre LaBrie e o baterista, além de um boato de que ele não falava mais com o baixista John Myung. Nenhum destes conflitos chegaram a ser verbalizados por nenhum integrante da banda. No final de 2010, Portnoy tentaria através de advogados (e não de ações jurídicas) retornar à banda, mas envolvido em um processo de seleção (que contratou seu xará Mike Mangini) de escolha de um substituto para o “super músico”, o DT deu às costas como resposta ao pedido de retorno.

No caso de Portnoy temos 6 anos desde sua saída. De lá pra cá – o moço que completa 50 anos ano que vem – já abraçou inúmeros projetos, sendo o The Winery Dogs, aquele que mais chamou atenção do público roqueiro. Em formato power trio que reúne além do baterista, o baixista Billy Sheehan e o guitarrista e vocalista Richie Kotzen, o TWD já lançou dois álbuns de estúdio e já fez turnês mundiais, que inclusive passaram pelo Brasil, mas o inquieto músico já esteve assumindo várias outras baquetas. Dê uma volta no Minuto HM e você encontrará alguns exemplos.

Ambos volta e meia falam sobre suas ex-bandas e fica bastante claro que eles se arrependeram das decisões que tomaram. Recentemente Max Cavalera deu inclusive declarações fortes sobre o Sepultura, reproduzidas aqui:

“Muitas pessoas gostaram realmente do primeiro álbum do Soulfly (se referindo ao seu primeiro trabalho fora da sua banda), há quem diga que é o seu favorito. Talvez seja pelo disco conter uma certa dose de desespero (risos). É algo meio que você perdeu tudo e tem que recomeçar com o que tem. O Sepultura realmente estava próximo de meu coração, era como se fosse meu filho. Agora, passado todo este tempo e pensando nisto, Igor e eu deveríamos ter demitido aqueles dois idiotas e mantido o nome; por qual motivo não fizemos isto, não sei. Naquela época não tivemos a visão disto tudo, então eu apenas saí” (confira o link)

Minha conclusão é que Max nunca chegou ao sucesso que o Sepultura alcançou, graças a ele e a Andreas, o principal responsável por segurar a marimba e dar continuidade ao nome que ele ajudou a consolidar. Tivesse conseguido com o Soulfly (ou mesmo com o Cavalera Conspirancy, sua banda com Igor) o mesmo destaque e notoriedade, talvez estivesse se lixando para seus antigos companheiros. Sua carreira não é ruim, mas jamais foi a mesma. Por outro lado, se o Sepultura com Derrick Green também não lançou álbuns como “Chaos A.D”, ao optar por um som diferente – especialmente com a saída do Igor em 2006 – manteve dignidade e teve que respirar “muito forte” para não desistir da missão com a banda. Segundo o próprio Andreas, foram dias difíceis. Segue uma de suas inúmeras declarações sobre essa fase:

“A imaturidade que a gente teve em relação aos negócios, confiar muito na galera, não ter um pouco mais de participação nas decisões como banda, que infelizmente resultou no que resultou (a saída do vocalista Max Cavalera, em dezembro de 1996). Foi uma consequência até de nossa falta de profissionalismo. Nossa estrutura não foi adequada ao crescimento da banda. E a culpa foi de todo mundo. No momento em que a banda estava explodindo no mundo.” (confira o link)

Desde que essa novela começou acho que este foi o fundo do poço. Chamar os ex-colegas “de sonho” de idiotas é um total desprezo pela história que eles ajudaram a construir. Não tivessem um pouco de sangue frio a banda já teria terminado e um capítulo da música mundial teria seu fim precoce. Não há reconhecimento, carinho e respeito. Não me surpreenderia inclusive se Max tomasse alguma medida sobre o nome da banda daqui pra frente.

Já Portnoy recentemente se rendeu à obra composta com o DT e anunciou que para iniciar as comemorações dos seus 50 anos em grande estilo, irá tocar o “12 Step Suite”, também conhecida em tom de brincadeira como “A Saga da Cachaça”, no Cruise To The Edge, um cruzeiro temático que terá entre suas atrações o ex-músico do DT. Confira a declaração:

“É uma pena que não fizemos isto com o Dream Theater. Mas devo isso aos meus fãs, e estarei acompanhado por músicos fenomenais e grandes amigos, que me ajudarão na tarefa” (confira o link)

Para que não ficasse nenhuma dúvida sobre seus projetos e desejos o músico viria a fazer uma declaração em um de suas redes sociais dizendo que retomar o repertório da banda não significava nada em termos de mudanças de planos. Leia a declaração original:

“Very excited to see all of the great feedback upon the announcement of my Shattered Fortress appearance at Prog Power 2017!
To answer a few questions I’ve been seeing:
• This is not “a new band or project”, it is “an EVENT” that will be making several select live appearances in select markets throughout 2017
• The lineup of musicians joining me for these shows will not be announced prior to our live debut at my 50th Birthday Concert on Cruise To The Edge…
I want that to remain a surprise until our unveiling
• The setlist at these shows will be comprised of the 12 Step Suite and (time permitting at certain shows) other Dream Theater songs that I’ve written the lyrics to
Keep in mind, I have no plans (or interest) in revisiting DT material in any of my other “real” bands…this is not an ongoing “project” or career move…this is merely a unique event that I am doing in select markets in 2017 to share with fans around the world…so catch it while you can!”

No caso do ex-músico do DT, embora ele esteja deixando bem claro que não pretende puxar o tapete de ninguém algumas observações entendo como importantes. A primeira é que desde a sua saída (ou um pouquinho antes) o Dream Theater não é mais o mesmo. Se é óbvia a constatação que uma banda cujo o ciclo já se encerrou e iniciou algumas vezes pode sim ter mudanças na sua sonoridade, com Mike Mangini essas alterações não se mostraram evolutivas. Pelo contrário: há uma forte constatação que não poderia haver outro músico mais competente para ocupar o lugar de outro monstro. Paradoxalmente desde sua inclusão, a banda compôs três discos que ocupariam o final da fila de qualquer lista. Sem “inspiração” (não acredito nisso, mas não achei uma expressão melhor) e muitas vezes até arrogante, o grupo perdeu uma ótima oportunidade – de quem sabe – partir para uma reviravolta musical como foi o Black Album para o MetallicA, ocupando um espaço vazio no mercado internacional. O negócio anda tão sério, que as reuniões são as responsáveis por movimentarem o status quo. Medalhões que permaneceram lançam – burocraticamente – seus álbuns sem o estardalhaço dos anos de glória, fazem turnês comemorativas (mais que troço sem imaginação fazer tour que celebre disco) e vão comprando o caviar que lhes é possível.As que acabaram sabem que nesse “gap” cabe muita gente e por isso ensaiam retornos que só merecem fireworks quando é o caso de bandas grandes, como aconteceu com o Guns N´Roses e olhe lá. Ainda tem um terceiro grupo: aqueles que fazem as infinitas turnês de despedidas. Que no final são apenas pausas de 3 a 5 anos que culminam em… Reuniões!

Há um potencial mais popularesco no DT que foi menosprezado por seus integrantes, preferiram aceitar o quinhão do público selecionado e optaram por afundar a minhoca em um som cada dia mais repleto de técnica, mas que menospreza as boas melodias e histórias. “The Astonishing” é um dos discos mais insuportáveis da história do prog metal, isso dito por um fã da banda.

O que restou aos dois personagens: lamentos e viagens ao passado. Se Portnoy ainda tange um repertório que até então era “intocável” em seus projetos mais recentes, já começa a flertar com seu passado de glória. O que pode significar uma recaída e um recado para os caras do outro lado do rio: “oi, eu estou aqui. Vocês estão sumidos”. Já Max acaba de jogar gasolina em uma sarça ardente, que jamais se apagou, muito por conta da sua falastrice e indignação. Não sobrou pra ninguém.

Por incrível que pareça, mesmo que indiretamente, isso não ajuda a carreira de nenhum dos envolvidos e a gente fica triste porque se é treta que sobra no presente, o que o futuro nos reserva?


(…)

Daniel da Costa Junior (In Memoriam)



Categorias:Artistas, Curiosidades, Discografias, Dream Theater, Entrevistas, Off-topic / Misc, Resenhas, Sepultura

3 respostas

  1. Fica aqui minha homenagem ao grande escritor Daniel, que nos deixou tão cedo e vai deixar saudade. Eu simplesmente não consigo escrever no post despedida que o Eduardo fez. Peço desculpas a todos, foi uma homenagem muito bonita.
    Em relação ao tema do post, nada mais adequado e que vem perdurando sabe-se lá quem até quando. Eu também considero o DT uma sombra do que foi no passado, mas até acho que o último álbum com o Portnoy ( Black Clouds and Silver Linnings )já mostrava um certo desgaste nas composições. É certo que o Mike original faz muita falta principalmente por trás das canções, como compositor e produtor, ao enxergar o que o público do DT gostaria de ver e ouvir. Na batera, também faz, mas aí temos ótimos músicos que podem dar conta pelo menos do recado principal, como é o caso do atual Mangini.
    Em relação ao Sepultura, acompanho muito pouco da carreira da banda, reconheço a importância, e mais do que isso, sabia do extremo entendimento que o Daniel tinha do grupo. Assim, é assinar embaixo, reconhecer cada palavra sabiamente nos deixada por ele.
    É uma pena que não tenhamos mais textos assinados tão soberbamente pelo nosso saudoso amigo Daniel.
    Fica aqui mais um reconhecimento de mais um excelente post.

    Alexandre

    Curtir

  2. A capacidade do Daniel em explicar os fatos com textos é algo que sempre o fez especial. Eu que sou um leigo no mundo do Rock gostava muito de ler os posts dele.

    Ele irá fazer muita falta para todos !!!!

    Curtir

Trackbacks

  1. Minuto HM – Retrospectiva 2017 – Minuto HM

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.