Ah, o saudoso Hollywood Rock. Ainda sem um post dedicado por aqui (ainda!), mas que deverá ter pois sua história é riquíssima e tão importante (ou dependendo do ângulo, até maior) quanto as já contadas do Rock in Rio e (Philips) Monsters of Rock.
Trago neste post um pouco da edição paulistana de 1995, mais especificamente o último dia da trinca deste ano, a famigerada segunda-feira (!) do dia 30 de janeiro. O dia 30 foi, na verdade, um show extra, já que as datas iniciais eram 27 e 28 de janeiro. A Rede Globo comemorava seus 30 anos e transmitiu o festival – um pouco menos da espera brasileira pelos Rolling Stones.
Um dia muito especial, tenho certeza, a todos que lotaram aquele “molhado” Estádio do Pacaembu na data. Eu tinha acabado de fazer aniversário de 13 anos e este então seria meu segundo show de grande porte, após o mais que memorável show do Macca em 1993, no mesmo local. Na verdade, o festival deveria ter sido no Morumbi, mas o estádio do São Paulo foi interditado pelo CONTRU e assim transferido para o municipal Paulo Machado de Carvalho.
O que trarei aqui é mais um mix de “flashes” de lembranças que tenho deste dia e é mais em clima de registro de uma homenagem – afinal, esta exata manhã que escrevo o post antecede, para mim, a noite de mais um show dos Rolling Stones que verei, minha segunda vez, e provavelmente última.
Para começar, e pode ser que eu esteja sendo traído pela memória ou por alguma confusão a partir de agora, portanto peço o devido “perdão virtual”, me lembro do anúncio do show na rádio 89 FM. Pela primeira vez na cidade, os Rolling Stones viriam. Os mais experientes, especialmente os mais experientes que eu, vão se lembrar que não era “trivial” como hoje em dia ter um grande nome como os Rolling Stones por nossas terras. Claro que os festivais já estavam trazendo grandes nomes, mas não era esta “avalanche” de shows que começou especialmente a partir do meio da década de 2000. Hoje em dia, é praticamente certo ter um show grande em São Paulo por mês – bom, na verdade, no mundo, já que a industria musical assim caminhou: menos vendas “físicas”, mais vendas em “serviços”.
Caramba, um show dos Rolling Stones. E logo do CD que já tínhamos, o primeiro CD com “conteúdo multimídia” (os CDs já não eram muita novidade, mas um CD que se colocava no computador para quem tinha o famoso “kit multimídia” e que se abria uma janela para dar play nas músicas ou mesmo ver DOIS vídeos e umas fotos, isso sim era tecnologia, meu amigo). Aqui começaria então mais um show que vi com meu pai.
A internet no Brasil começava a se tornar uma realidade, lembro que em 1995 eu já me arriscava sair das BBS e tentar usar um navegador daquelas estranhas “tais páginas www”, “http”, um monte de coisa então totalmente “nerd” e desconhecida, já que ter uma conta de e-mail era um dos auges tecnológicos brasileiros. Não havia informação suficiente por aqui. Havia, sim, gente falando que esse show traria “um palco com uma cobra metálica que cuspia fogo”. Que sensacional!! Imaginem isso? “Vai começar o show e aquela cobra vai cuspir uma labareda, e é fogo de verdade!!!!”. O que agora soa ingênuo era uma baita diferencial na época. E já que falei um pouco sobre tecnologia (o mundo estava mudando muito na época), quem se lembra disso?
E da ótima paródia, que até hoje os nerds sabem a letra de cabeça:
Mas voltando… diferente do show do Macca em 1993, o festival já tinha a pista “segregada” de quem iria assistir sentado nas arquibancadas ou numeradas do estádio, inclusive com preços diferentes. Assim como em jogos de futebol, a arquibancada tinha os preços mais populares e as numeradas, os mais exclusivos. O preço da pista (não existiam ainda pistas VIP, golden, Premium, bla-bla-bla) era o intermediário. Fiz uma pesquisa e encontrei alguns preços da época, já no plano Real:
Arquibancada: 18,00 ; Pista: 25,00 ; Cadeira Descoberta: 80,00 ; Cadeira Coberta: 120,00.
Apesar de não conseguir confirmar de momento estes preços (e havia meia entrada para todos os setores), tenho algumas lembranças que era por aí mesmo. Meu pai já reclamava dos preços, comentando que era muito caro – e não se engane, ao contextualizar os valores com o ano, são realmente valores altíssimos, para um país que começava a ter uma nova esperança com um novo modelo político e financeiro, especialmente para mitigar o grande problema financeiro do país, a inflação (ok, agora as risadas estão liberadas).
Chega a ser engraçado ver isso hoje (Mick no alambrado do aeroporto, lojas Mesbla, etc), sem contar os problemas que continuam até hoje:
Nós fomos de arquibancada neste show. Chegamos cedo e nos posicionamos bem no meio da arquibancada na vertical, e na horizontal, o mais próximo que conseguimos do palco, passando um pouco uma imaginária linha do meio campo. Era o local mais ou menos de onde costumávamos também assistir aos jogos do Corinthians (os corinthianos vão se lembrar: embaixo de onde ficava a Torcida Camisa 12 no Pacaembu). O palco foi montado, como de costume na época e também depois, na frente do Tobogã, ou para os mais saudosos, na frente “de onde ficava a concha acústica”.
O Pacaembu recebia em suas arquibancadas um público bem maior quando da sua inauguração, coisa que foi caindo ao longo dos anos, sendo que nesta época podemos dizer sem muita precisão matemática que foi o “meio” da capacidade. Eu imagino – e quem puder falar com mais precisão, é bem-vindo – que para este show tivemos mais ou menos 75.000 pessoas, com mais gente na pista. Lembro que tudo estava lotado, diria até entupido, com gente nas arquibancadas sentadas nas escadas, algo que hoje praticamente não existe mais mas que era comum na época.
Tenho na minha cabeça aquele palco até hoje. Aos 13 anos de idade, ver aquela monstruosidade, no bom sentido, era muita diversão. O palco tinha um telão ao fundo gigantesco, “uns bonecos”, como disse à época, passarelas nas laterais para Jagger fazer suas tradicionais andanças… aquilo era muito alto, muito grande. Ahhh, e lá estava a exótica cobra – ok, neste ponto já dá para falar que era uma serpente, hehehe. Ela tinha 32 metros. Eram muitas luzes, e lembro de um poste que ficava bem no meio do palco. Era um espetáculo sem precedentes, mas não só para mim, para todos.
O céu de São Paulo era outro que queria “dar show” no dia, como já havia dado especialmente no primeiro dia do festival. Nós chegamos mais ou menos umas 15h00 em nosso local no estádio. Em torno das 16h00, me recordo de uma torrencial chuva, sem relâmpagos ou raios, mas uma água absurda. O estádio se cobria com suas descartáveis capas de chuva, mas era muita água mesmo. A minha rasgou logo no começo (como acontece até hoje).
O lineup antes da tour Voodoo Lounge do headliner (que se tornou a maior em termos de arrecadação da história da música até então) era: Barão Vermelho, Rita Lee e Spin Doctors. O Barão subiu ao palco e logo no início, alegando que “os instrumentos” estavam dando choque, saíram. Chovia forte. Sob vaias, a banda insistiu e tentou voltar ao palco minutos depois, mas desistiram. Assim, não houve show e as vaias continuaram.
A Rita Lee entrou pouco tempo depois, algo em torno de 20 minutos. Ainda com chuva, Rita Lee fez seu show “normalmente”. Ou seja, do primeiro dia, houve uma inversão: o Barão levou heroicamente o show no primeiro dia, sendo Rita Lee a que foi vaiada ao sair do palco. Pelas minhas lembranças deste dia 30, as vaias foram para Frejat e CIA, com efusivos aplausos para a Rainha do Rock do Brasil. Diz a lenda que Jagger assistia o show de Rita Lee na lateral do palco.
O auge do show da Rita Lee foi com a música “Miss Brasil 2000” e também quando a Valéria Mendonça entrou no palco na música. Foi o que foi comentado do show depois. Ela entrava no palco com apenas uma tiara e uma capa branca, que ela depois abriria mostrando que estava nua. Rock and Roll. Ela já fazia esse “número” na mídia antes, mas sua popularidade explodiria após os shows. Diz a lenda, parte 2, que Jagger fez um approach sem sucesso. É, pelo jeito Jagger realmente queria uma mulher brasileira – e conseguiu, não é mesmo?
Em paralelo, me recordo que tinha um grito de “uhhh, tererê, uhhhh, tererê” da galera. Era uma das modas no Brasil. Achava aquilo meio chato (hoje talvez eu diria insuportável). Isso vinha da expressão “Whooomp!! There it is” do basquete americano (o famoso “é isso aí” deles em uma época de ouro da NBA) e que no Maracanã as torcidas gritavam nos jogos de futebol lá por 1993, 1994. Aquilo ecoava no Pacaembu toda hora, nos jogos e no show, por isso comento por aqui.
Lembro dos Spin Doctors subindo ao palco sob muita desconfiança e já com a galera impaciente pelo show principal. A combinação chuva, som desconhecido e incompatível com o estilo e conhecimento da galera, sem contar que era o show que antecedia os Rolling Stones, se provou fatalmente negativa para a banda.
Lembro claramente de ver um copinho cheio estourando no meio do peito de um membro da banda, mas de forma bastante profissional, o show aconteceu normalmente, talvez tenha sido reduzido um pouco apenas. A banda claramente se esforçou para agradar ao público, mas foi desistindo com as vaias, gritos ofensivos com tudo que era atirado no palco. O clima era de “sai logo daí”. Não tem como ter um show assim.
Uma das lembranças pontuais que também tenho era que do show da Rita Lee para este, houve uma mudança grande na qualidade do som, para melhor. É a tal diferença no “tratamento” e na qualidade dos equipamentos de uma banda gringa para as nacionais, diferença essa que até hoje existe, só que em menor escala, mas que na época era gritante.
O vídeo abaixo é uma daquelas coisas engraçadas de se ver e é do primeiro dia do show, mas que traz a banda trazendo seus “aparelhos à prova d’água”. Risadas liberadas – valeu, Globo:
O setlist abaixo não é do dia 30, e sim da primeira noite, mas traz o que foi provavelmente o show deles também na segunda-feira:
Para os Stones, a chuva finalmente daria momentos de folga. Era coisa do destino, de uma grande noite que ainda viria. Eles demoraram para entrar no palco, causando até algumas vaias pontuais. Mas a abertura do show foi emblemática, talvez uma das que mais me marcou de todos os shows que já vi: as luzes se apagaram, e a cobra (serpente) realmente cuspia fogo. E mesmo estando na arquibancada, deu para sentir o calor. Era algo inimaginável.
A banda trazia uma mudança em sua formação “fixa”: Darryl Jones substituiria Bill Wyman, que desde 1991 havia saído dos Stones. E, claro, os “trocentos” convidados, com destaque para os backing vocals de Lisa Fischer, além dos músicos no sax, trompete, etc. A abertura foi com um cover do The Crickets: Not Fade Away. Foram 22 músicas no total, sendo 4 faixas do álbum de trabalho, 3 do Let It Bleed, 2 excelentes covers e o restante dos diversos álbuns da carreira grande discografia da banda.
Me lembro da explosão de alegria minha, do meu pai e do público a cada “medalhão” que passava. You Got Me Rocking foi posicionada logo para explodir de vez a galera. Mas (I Can’t Get No) Satisfaction e seu riff faria o estádio gritar e pular como poucas vezes vi. Era tudo muito novo, e não só para mim, mas para os presentes – ver esta música, ver este show, foi um marco na vida de todos. Contextualizando então, nem se fala. A banda tocou Angie também antes da metade do show, com muitas lágrimas de muitos dos presentes. Eu que conhecia tais medalhões lembro de ter ficado muito feliz de poder curtir sons deste gabarito.
Keith Richards assumiu os vocais em duas faixas sequenciais: Before They Make Me Run e The Worst. Eu lembro de ter questionado o porquê disso a meu pai, já que eu queria era ver o Mick Jagger correndo para lá e para cá. Sympathy For The Devil rendeu um elogio de um estranho a meu pai sobre mim: “ele já fala inglês?”. Coisas que marcam. E a partir desta, uma verdadeira enxurrada de hits, com a banda voltando para o bis e fechando com Jumpin’ Jack Flash, uma das minhas favoritas até hoje – rock and roll de primeiríssima linha. Lembro também de um imenso boneco inflável durante o show.
Uma noite especial. Chuva e choques, o de verdade e os choques emocionais de um show de grande porte, de algo novo. Uma memória boa de se ter.

Sao Paulo, SP, Brasil Jan/1995
Show Voodoo Loungue, dos Rolling Stones, durante o Hollywood Rock, no Pacaembu em SP./Rolling Stones Voodoo Loungue concert, during Hollywood Rock, at Pacaembu stadium in SP.
Foto © Marcos Issa/Argosfoto
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Eduardo.
Categorias:Artistas, Cada show é um show..., Covers / Tributos, Curiosidades, Entrevistas, Músicas, Resenhas, Rolling Stones, Setlists
Excelente lembranças
Acho que o show de São Paulo foi antes do que no RJ. No RJ a ordem das bandas foi mudada e quem abriu pros Stones foi a Rita Lee. Tocou o Barão, Spin Doctor e Rita Lee
No livro do Barão Vermelho – por que a gente é assim – eles citam essa passagem como um momento tenso pois com a chuva havia um sério risco deles morrerem eletrocutados………passagem muito legal pra quem se arrisca a ler esse livro
No mais, uma noite com Rita Lee, Barão e Rolling Stones não tem como dar errado
O tratamento dado ao Spin Doctor foi uma vergonha….muita falta de respeito das pessoas …….um absurdo …..vergonha ao qual hoje, infelizmente, nos acostumamos
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Rolfístico, correto, no Rio foi logo no início de fevereiro e a inversão que você fala também aconteceu.
Sobre o Barão, na primeira noite eles foram heróis, inclusive há comentários do próprio Mick Jagger elogiando a postura da banda. Mas já no dia 30, que eu estava, realmente a coisa devia estar perigosa, pois eles não tocaram. O que ficou “estranho” ao público foi ver a Rita Lee fazer o show normalmente poucos minutos depois, sem mudanças no tempo (chuva). Enfim, hoje é possível entender.
Sobre o Spin Doctors, eles foram muito profissionais. Não sei como foi a recepção nos outros dias em SP e no Rio, mas neste dia 30, foi das piores que já vi. Voava de tudo no palco. O som não me agradou na hora, talvez fosse até de dar uma chance e ouvir alguma coisa dos caras hoje, com outra cabeça. E os caras não pararam, não hesitaram, seguiram seus “personagens profissionais” até o final.
Será que alguém conhece algo mais direcionado da discografia deles para indicar?
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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Muito legal a lembrança. Eu fui ao segundo show no rio (se não me engano no dia 04 de fevereiro). Neste dia não choveu. Na minha cabeça a ordem foi das bandas, Barão vermelho, Rita Lee e Spin Doctors. A recepção ao Spin Doctors foi a mesma descrita aqui. Tocaram abaixo de vaias e objetos atirados. Mas me marcou bastante a postura profissional deles. Tocaram o set deles sem reclamar de nada e tudo mais. Aliás, poderíamos considerar o Spin Doctors uma “one hit wonder”???
Olhando as imagens do palco vejo o quanto ele era elaborado com a serpente e as passarelas. Impressionaria hoje, imagina nos idos de 1995.
Foi o primeiro show de grande porte que assisti. Precisei parcelar a compra das passagens aéreas em 10 vezes pra conseguir encaixar no meu parco orçamento.
Lembro que fomos num grupo de 6 amigos pro Rio e o único jeito de nos deslocarmos por lá foi alugarmos uma Kombi. Hilário!!!
No dia posterior ao show “destacamos” alguns banners do show que estavam espalhados pelas ruas da cidade maravilhosa. Depois, por muitos anos este banner ficou pendurado na parede do meu quarto.
Memórias sensacionais.
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Fala, xará. Obrigado pelo comentário e que bom que o post também lhe aflorou lembranças – das boas.
Sobre a ordem das bandas, creio que apenas no Rio houve a tal inversão. E o palco era mesmo monstruoso, algo impactante especialmente considerando que quase ninguém se arriscava em trazer toda a parafernália do exterior ao nosso país. Sorte nossa.
A parte da Kombi é sensacional, tenho certeza que é uma memória daquelas únicas na vida. E é isso que fica no final de tudo, não é mesmo?
E o poster? Saiu da parede, claro, mas ainda o tem?
Obs.: eu devo a resenha do show 2 em São Paulo este ano… mas fica a dívida sua por aqui para o show em Porto Alegre, ok? 🙂
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Eduardo.
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Um dos melhores (senão o melhor) show que vi até hoje. Estive no Pacaembu no dia 28, na minha memória a ordem foi Barão Vermellho, Spin Doctors, Rita Lee e Rolling Stones, fui na pista e o calor das chamas era sentido do solo, ainda hoje sempre que escuto simpathy for the devil ainda me arrepio com a lembrança. Este foi aquele show que podemos dizer: Quem viu, viu! Quem não viu, perdeu!
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Olá Renato, primeiramente seja bem-vindo ao Minuto HM. Valeu pelo comentário.
Você tem razão quanto à ordem das bandas no dia que você foi. O único dia que houve a tal mudança foi na segunda-feira, dia 30.
Um palco memorável, digno ainda de impressionar mesmo nos dias de hoje. Datas realmente memoráveis no Pacaembu.
Continue participando por aqui!
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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[ ] ‘ a,
Eduardo.
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Pro meu gosto, totalmente dispensável esta edição do Hollywood rock
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No Rio:
[ ] ‘ s,
Eduardo.
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